A
peste negra ortográfica tinha começado a notar-se nas capas, nas
páginas dos livros, para não referir a comunicação social onde um
semanário dito de referência congratulava-se bacocamente por ter
começado a poupar letras.
Agora, decretada a imposição de todos os documentos oficiais serem
escritos pelas regras do Acordo Ortográfico, é dado o primeiro murro
sério anunciando a conjugação dos golpes seguintes até ao KO final que
atirará ao tapete o português, entre aclamações da turbamulta ignara e a
indignação da gente de bem.
O disparate ortográfico que nenhuma ciência lógica sustenta de a
grafia do português se normalizar pelo padrão do português-brasileiro,
vai ser politicamente imposto pela camarilha que nos tem desgovernado há
mais de trinta e cinco anos. É um acto dentro dos padrões de submissão
antipatriótica e de direita que nos atirou para a crise económica social
e política em que estamos mergulhados e para a perca de identidade
cultural, de que o Acordo Ortográfico é a mais cabal demonstração.
Nada o justifica. Contra o Acordo Ortográfico, ultrapassadas todas as
diferenças políticas, uniram-se as vozes mais representativas da
cultura e da ciência nacional. O Acordo é um dislate sem par em qualquer
parte do planeta que só existe por boçal vontade política. Basta olhar
para o inglês para se verificar que as diferenças mais substanciais nos
países onde é língua oficial se localizam exactamente na grafia. O mesmo
sucede com o espanhol. Duas das línguas mais faladas no mundo.
Fica-se assolado quando se ouve o actual Secretário de Estado da Cultura afirmar, em recente entrevista, que “daqui
a poucos anos o português de Portugal desaparecerá da internet,
engolido pela variante mais forte, que é o português do Brasil. É
preferível assumir que essa situação existe e tentar fazer o melhor”.
Semelhante argumento só pode ser esgrimido por um inerme defensor da
cultura, digno par dos outros governantes e subgovernantes. Faz-nos
entender quão farsolas são quando afirmam o seu amor por Portugal e, no
cume da hipocrisia, pelas tradições mesmo as que são estagnantes.
O da cultura, que quer meter a cultura no bolso das calças para a
atirar na primeira papeleira que encontrar, é mais um entre o magote de
escritores assim-assim, nacionais e estrangeiros, cruzados a soldo da “jihad”
editorial que pretende colonizar o gosto e a qualidade rasourando-o
pela bitola de um medíocre gosto mediano. Deve ler pouco, quando não
saberia que na literatura portuguesa, só a literatura oriunda do Brasil
alinha pela ortografia preconizada no acordo.
Com gente deste calibre que, com beócios pragmatismos, despreza o
português como língua viva, dinâmica e esteio da identidade nacional,
Portugal está no caminho do suicídio colectivo para onde as desgraçadas
políticas económicas o empurram.
É um dever patriótico continuarmos a lutar contra o Acordo
Ortográfico. Tentar por todos os meios que volte a estar na agenda da
Assembleia da República. Iniciarmos a desobediência civil não escrevendo
pelas regras desse aborto ortográfico. Lutemos contra mais este acto de
servilismo!
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