Foi um Sábado em cheio, memorável, com mais
de 30 cortejos fúnebres por todo o país. A luta é alegria, cantavam os outros. E
assim foi, salvo desonrosas excepções e apesar de ter sido uma desgraça
gigantesca o que desmobilizou cerca de um milhão de portugueses das suas rotinas
de fim-de-semana. As exéquias contemplaram a confiança no Governo e a tolerância
às suas políticas. Enterrou-se uma paz podre, imediatamente baptizada de "amplo
consenso social", da qual, durante mais
de um ano, se serviram aqueles que, objectiva e literalmente, andam a enterrar o
país.
Hoje foi uma Segunda-feira que se notou
diferente. No ar ainda se respira muita poeira levantada por 2 milhões de pés
que pisaram bem firme o seu BASTA. O incómodo entre os profissionais do tudo bem
entorpecedor de consciências continua por demais evidente. Aconteça o que acontecer
a partir de agora, e tudo está em aberto, resulta claro que nada será igual ao
que foi até 15 de Setembro de 2012.
E é bom sentirmo-nos
gente outra vez. Gente que gosta de ser tratada como gente, gente que não
aceita não ter vida de gente, gente com direito a um futuro de gente. Gente
desabituada a envolver-se em causas colectivas a aprender que nada se conquista
em silêncio.
Devolvam-nos as nossas vidas. Foram-nas
levando, uma por uma, diante de olhos indiferentes ao que acontecia aos outros,
convencidos que nunca chegaria a vez da
sua. Assim conseguiram levá-las quase todas, assim continuariam a fazê-lo sem o
BASTA de Sábado passado. Está na hora de exigi-las de volta. A luta começa
agora. Com todos e com todas, todos ao mesmo tempo, todos por todos, porque só
assim se ganha. Se é que a experiência já foi suficiente para aprender como se
perde.
devolvam-nos as nossas... VIDAS???
Era este um dos slogans mais gritados e afixados nos cartazes, avenidas abaixo e acima: «devolvam-nos as nossas vidas».
Ainda antes de a CGTP ter descoberto o filão dos seis mil milhões de euros que prometem resolver todos os nossos problemas imediatos, a angústia que se apossou de todo um povo resumia-se naquele apelo. Mas porquê aquele e não outro? Podiam ter escrito «devolvam-nos o nosso dinheiro», «o nosso futuro», «a nossa esperança»... tanta coisa.
Mas não, são "as nossas vidas" aquilo que queremos de volta e por duas razões. Primeiro porque, no íntimo sabemos todos que perdida a Vida, tudo está perdido. E, em segundo lugar, porque sentimos que as nossas vidas ainda nos podem ser devolvidas, independentemente de nos terem sido roubadas por aqueles a quem dirigimos o apelo... ou por outrem, quiçá refugiado em Paris.
Mas há uma terceira razão, subliminar, para a escolha deste apelo e não outro. É que por nossas próprias mãos, isto é, com o dinheiro que entregamos ao Estado, foram sacrificadas já quase 100.000 vidas (completam-se já no início de Novembro) que jamais poderão ser devolvidas aos seus titulares. Foram interrompidas... e, ou contrário de outras interrupções, não podem ser reactivadas. Nem devolvidas. Talvez por isso, havia também uns cartazes a falar de "Injustiça". Os cartazes, no fundo, gritam aquilo que nos enche o coração... e o remorso.
Ex abundantia cordis os loquitur.
Luís Botelho
Comissão Nacional pro
Referendo-Vida
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