“SONO
FINAL, NO SOLO PÁTRIO… BEM MERECIDO PELO HOMEM REI, COMO CRISTÃO E COMO
PORTUGUÊS…”
A 5 de Abril de 1967, faz hoje precisamente quarenta
e cinco anos, chegaram a Lisboa em aviões da Força Aérea Portuguesa, os restos
mortais do Rei D. Miguel I e sua mulher, a Rainha Adelaide Sofia.
No ano de 1966, celebrou-se o 1º Centenário da morte
de Sua Majestade El-Rei Senhor D. Miguel, ocorrida em Bronnbach
(Alemanha), no ano 1866.
Um grupo
de monárquicos, como apoio do Sr. D. Duarte Nuno de Bragança, intercedeu junto
do governo português para recolher de volta os restos mortais deste monarca e
esposa ao solo da Lusa Pátria. O pedido foi bem acolhido pelo Presidente do
Conselho, que ordenou que as cerimónias dessa trasladação se revestissem de
todas as honras de Estado.
No exílio
D. Miguel falava do adorado Portugal e vivia permanentemente cercado das boas
recordações da sua Pátria. Após o casamento com a princesa D. Adelaide de
Loewenstein, D. Miguel sossegou na paz do seu lar, entregando-se à esposa e à
educação dos filhos. Mas nunca perdeu o amor pela Pátria – Portugal. Era uma
verdadeira paixão. Dizia muitas vezes que nunca mais lá voltaria, morrendo de
um angustiante desgosto.
A Rainha
Senhora Dona Adelaide aprendera a falar e a escrever português e acompanhava o
Rei, seu marido, no vivo e sincero amor pelos portugueses e por Portugal que
considerava a Sua Pátria.
Portugal
também não o esqueceu, pois quando chegou a triste notícia da sua morte ao Reino,
naquela manhã fria de 14 de Novembro, toda a imprensa fez eco da morte do Rei
exilado. O Rei D. Luíz I decretou luto nacional por vinte dias.
Voltemos
ao dia 5 de Abril de 1967. Foi na bela capela da Base Aérea de Alverca que se
deu o reencontro das urnas com os despojos reais de D. Miguel e de Dona
Adelaide. Os restos mortais de D. Miguel, oriundos da Baviera, e os da Rainha
D. Adelaide, procedentes da Abadia Beneditina de Ryde (Ilha de Wight) e onde
professara votos depois da morte do marido, encontravam-se finalmente em Luso
território.
Naquele
local sagrado, procedeu-se à imposição dos pavilhões reais, seguindo-se o
cortejo fúnebre, com as devidas honras dos vários ramos das Forças Armadas
Portuguesas.
Já no
final da tarde desse dia, os despojos reais foram acolhidos no Templo Vicentino
pelo Reverendo Padre Correia da Cunha que os encaminhou até ao estrado montado
no transepto. As urnas reais foram colocadas sobre áureas essas, ladeadas de 4
enormes tocheiros dourados, dando-se início a uma pequena celebração litúrgica.
A guarda de honra foi prestada por cadetes das várias escolas militares,
cavaleiros da Ordem Soberana e Militar de Malta, a que D. Miguel pertencera, e
cavaleiros da Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém.
As
cerimónias solenes, com missa de “Requiem” seriam reservadas para a manhã do
dia seguinte, com a presença de Sua Eminência o Cardeal Patriarca de Lisboa, D.
Manuel II Cerejeira, numerosos cónegos e beneficiados da cúria patriarcal. O
canto esteve entregue ao Grupo Coral Stella Vitae, tendo como acompanhamento a
Orquestra da Emissora Nacional.
Todo o
majestoso templo se encontrava decorado de panejamentos negros bordados a ouro
e prata. No largo frontal da igreja, estavam formadas forças em traje de gala do
exército, da armada e, em plano de destaque, a Banda da Marinha de Guerra.
Os
convidados para as Solenes Cerimónias iam tomando os lugares que lhes eram
indicados pelos serviços do protocolo do Estado.
No ano de
1967, era um jovem adolescente, mas recordo como se fosse hoje, que ao subir as
escadarias da majestosa Igreja de São Vicente de Fora, o Sr. D. Duarte Nuno de
Bragança e toda a família, foram aclamados efusivamente por um grupo de
monárquicos com vivas, palmas e gritos de Viva o Rei! Viva o Rei! Viva o Rei! O
que foi repetido pela multidão do povo em entusiásticas e prolongadas ovações.
Perto do
meio-dia, chegou o Sr. Prof. Dr. Oliveira Salazar que foi recebido com uma
aclamação: Viva o Rei! O Presidente do Conselho esboçou um suave sorriso, que
penso ter sido revelador do seu mais íntimo pensamento: “Como gostaria de ser
1º Ministro de um Rei Absoluto.”
A
encerrar o cortejo das mais relevantes figuras públicas do Estado, estava o Sr.
Presidente da República, Almirante Américo
de Deus Rodrigues Thomaz, ao qual foram prestadas as devidas honras militares pelas
forças militares ali presentes.
Na foto
podemos observar a recepção que o Padre Correia da Cunha prestou ao seu amigo
Almirante, dos tempos da Armada, quando o mais alto magistrado da nação se
dirigia para as cerimónias exequiais de Sua Majestade El-Rei D. Miguel de
Bragança.
Na
Marinha Portuguesa, o Padre Correia da Cunha exerceu as funções de capelão.
Nesse dia era o anfitrião, na qualidade de Pároco da Paróquia de São Vicente de
Fora e guardião do Panteão da Dinastia de Bragança.
Após a
leitura do Evangelho, subiu ao púlpito o Padre jesuíta Dr. Domingos Maurício,
que prestou uma sentida homenagem à memória de D. Miguel: - “No desterro
imposto pelas contingências políticas obscureceu-se a lembrança das vossas
benemerências nacionais… Surgiu, enfim, o momento redentor, a hora da reparação
sincera, que vos reintegra no lugar que vos compete na tessitura histórica de
Portugal.”
Terminada
a missa, cantada em latim, o Sr. Cardeal Patriarca, dirigiu-se para o
transepto, onde deu as absolvições finais.
Num
pequeno cortejo encabeçado pelo Reverendo Padre Correia da Cunha, as urnas
foram transportadas pelos claustros do mosteiro até ao Panteão da Dinastia de
Bragança. Os sinos dobravam a finados e uma bateria de artilharia saudou Sua
Majestade El-Rei D. Miguel de Bragança, com vinte e um tiros. Em dois túmulos
vazios, no lado esquerdo do altar, obra do prestigiado Arqtº Raul Lino, os
ataúdes foram tumulados, ficando ao lado do túmulo de D. Pedro IV, irmão com o
qual D. Miguel andou desavindo em vida.
Curiosamente em
Março de 1972, os restos mortais de D. Pedro IV, Rei de Portugal e 1º Imperador
do Brasil, por decisão do Governo Português deixaram o Panteão da Dinastia de
Bragança e foram repousar no Monumento do Ipiranga em São Paulo – Brasil.
A partida dos despojos mortais de D. Pedro IV desfalcou o Panteão Real de São
Vicente de Fora, povoado de tantas memórias ligadas à enorme civilização
lusíada, de que tanto nos orgulhamos. Mas uma coisa é certa, na sua nova morada
ele seria único e insubstituível como o verdadeiro fundador da nacionalidade
Brasileira.
Resta-nos o coração de D.Pedro IV na invicta cidade do Porto, e na
memória dos portugueses como símbolo de liberdade, patriotismo e coragem deste
nobre povo.