Pedro Arroja lança hoje (20/11/2013) o livro “F, Portugal é uma figura de mulher”.
Num exercício polémico e algo desconcertante, pretende deixar um legado à
sua neta. "Andámos a imitar ideias e instituições que não são nossas e
temo-nos dado mal". Os 100 anos de República foram sempre maus.
Num exercício polémico de 272 páginas, o economista Pedro Arroja
questiona o regime, defende o fim dos partidos políticos, advoga a saída
de Portugal da União Europeia e conclui que o país está a caminho da
ruína. Com um olhar polémico, às vezes desconcertante, o autor propõe
uma outra esfera de pensamento.
Renascença - Pela terceira vez em 30
anos, Portugal está sob intervenção externa. Como chegamos aqui?
Pedro Arroja - Basicamente, porque
andámos a imitar ideias e
instituições que não são nossas. São ideias e instituições desenvolvidas nos
países do Norte da Europa, especialmente na Alemanha, e que, genericamente, descreveria como saídas da reforma protestante, que é uma reforma contra o catolicismo e, portanto, contra a nossa cultura de portugueses. Nós temos andado a utilizar essas instituições
e damo-nos mal
com
elas.
Renascença - Sócrates e Passos Coelho
não tiveram responsabilidade?
PA - Acho que eles
tiveram azar. No fim de contas é o sistema partidário que tem vindo a dar cabo do país. O Governo do engenheiro
Sócrates teve azar porque Portugal declarou falência sob a sua presidência e
Passos Coelho também teve azar porque tem de andar a gerir a falência. Eles também contribuíram, mas não
contribuíram por mal. Não sabem o que andaram, o que andam ali a fazer. Nenhum dos dois.
Eles foram lá postos pelos portugueses, mas parece-me óbvio [que escolhemos duas pessoas
impreparadas], porque, senão, o país não estaria no estado ruinoso em que se encontra.
Renascença - Estamos de novo sob
intervenção externa, desta vez com uma troika. Estamos a ser conduzidos
a bom porto?
PA - Não. Os défices
continuam a existir e as dívidas continuam a acumular-se. Esta estrada só nos
conduz à ruína,
como
podemos ver pela Grécia. Nós só melhoraremos quando abandonarmos essas instituições da União Europeia e fizermos outras
reformas internas. Embora haja aquela capa da troika, quem manda são os
alemães, porque são eles que nos emprestam o dinheiro.
Renascença - Se fosse ministro das
Finanças, de quantos anos precisaria para endireitar este Estado, este país?
PA - No espaço de ano e
meio, a economia estaria a crescer, enormemente. Qualquer homem ou grupo de homens que
conheçam as tradições dos portugueses põe a economia florescente no espaço de ano e meio e as
medidas são: produtos que nós já consumimos, que nós produzimos, podem ser importados, mas todos passarão
a ter uma taxa de importação,
digamos, de 30%. Pode continuar a comprar leite vindo Alemanha, mas vai ser 30% mais caro que o leite português e a diferença é para o Estado.
Pode continuar a comprar peixe no estrangeiro, só que vai pagar um imposto aduaneiro de 30% ou 40%, porque a
prioridade é dar emprego e rendimentos aos pescadores portugueses. Quer comprar maçãs vindas da Nova Zelândia?
Claro que pode,
mas à
entrada na fronteira, paga 30% ou 40% mais.
Renascença - Nesta situação que papel
cabe ao Estado?
PA - O Estado que
actualmente temos, o chamado Estado social ou Estado providência, é uma invenção alemã, do Bismark. Como não é nosso, nós damo-nos mal, está arruinado. A nossa tradição de Estado
não é de Estado
providência,
que faz tudo pelas pessoas, cuida da educação, cuida da saúde, cuida daquilo que elas comem. A nossa
tradição é o Estado subsidiário que consiste no seguinte: há um problema que a comunidade tem para resolver,
digamos, em Freixo de Espada à Cinta. Presume-se que os habitantes vão resolver o
problema. Se não conseguem, apela-se à comunidade mais próxima – a Câmara Municipal -, depois, ao distrito de Bragança, depois, a todo o
Norte e, só em
última
instância, vem o Estado resolvê-lo. O Estado só intervém para resolver problemas que os diferentes níveis de comunidade não
conseguiram resolver. Só para aqueles que não têm meios é que o Estado se deve chegar à frente. O Estado deve ser o
último recurso e não o primeiro, o ‘faz tudo’.
Renascença - No início da entrevista,
disse que Portugal utiliza instituições saídas da reforma protestante que são
contrárias à cultura portuguesa. A que instituições se referia?
PA - A ideia do mercado
único, que é a
ideia
do liberalismo económico, é uma ideia do Norte da Europa, que funciona muito bem naqueles países, mas que a nós
nos arruína. A ideia do Estado de Direito, que tem contribuído para desfazer o nosso sistema de justiça
– que é também uma ideia protestante, com origem no filósofo Kant –, e que consiste em pôr a lei acima
de tudo. Essa é uma concepção protestante, ao passo que a nossa concepção católica é a da subordinação
de todas as pessoas a uma
pessoa, que interprete a tradição. Enquanto o Estado de Direito diz que a lei é
mais importante que as pessoas, a nossa tradição católica diz que as pessoas são
mais importantes que a lei. As pessoas não existem para servir a lei, é o
contrário, as leis é que existem para servir as pessoas. Mas a instituição mais
danosa para nós – também com origem protestante - é a dos partidos políticos. O que os partidos políticos vieram
fazer foi desunir os portugueses. Na realidade, os partidos conduziram o país à
ruína e não vão ser capazes de o tirar de lá. Só vamos ser capazes de
restaurar Portugal quando os partidos saírem da frente e os portugueses se possam
verdadeiramente unir em torno dos valores que lhes são tradicionais.
Renascença - Sem os partidos, como se
escolheriam os governantes?
PA - Votando na mesma,
mas em pessoas, sem partidos. Vou dar dois exemplos. A democracia grega era uma democracia, mas não votavam todos. Só votavam pessoas acima dos 30 anos.
E porque é que só votavam pessoas adultas? Porque já tinham governado alguma
coisa. Quando
se
vota para a governação de um país, está-se a escolher as pessoas que vão governar, mas não pode ser qualquer
um a votar. Não posso pôr um menino de 18 ou 19 anos a votar para escolher os governantes de Portugal, como
fazemos agora, quando esse menino vive em casa dos pais, ainda não governou coisa nenhuma.
Capacidade de votar nunca antes dos 30 ou dos 35 anos. É discutível, mas meninos de 18, 19, 20 anos?
Nem pensar. Outro exemplo: a eleição do Papa Francisco, na Igreja Católica, é um exercício
democrático. Foi eleito democraticamente, mas as pessoas que votaram não incluíam seminaristas. Só votam pessoas que, pela sua experiência de vida, já
governaram muitas coisas e sabem escolher a pessoa que melhor pode governar a Igreja.
Renascença - No seu livro, outra das
críticas que faz é à República, mas Portugal tem 100 anos de República e…
PA - ... e foi sempre
mau. Os partidos foram introduzidos em Portugal em 1820, aproximadamente, e toda a história do séc. XIX em Portugal é uma história
turbulenta. Gerou uma guerra civil, períodos de ruína financeira. Foi muito mau, mas, ainda assim, havia um
Rei, que era uma figura de unidade nacional. Com a República, estamos sempre na ruína. Pelo
contrário, na Monarquia, sobretudo a Monarquia Absoluta, que é a nossa verdadeira tradição, nós vivemos os
períodos mais grandiosos da nossa história. Olhando para trás, em termos de regime político, o que foi
bom para nós, portugueses, com o qual conseguimos ser grandes no mundo, foi a monarquia e a
monarquia absoluta.
Renascença - O regresso à Monarquia
poderia ser um passo para a solução?
PA - Seria um passo muito
importante, não tenho dúvidas.
Seria voltar às nossas tradições, voltarmos ao regime sob o qual Portugal conseguiu grandes obras no mundo, porque
havia uma figura de unidade nacional, que era o Rei.
Renascença - Diz que o seu livro é uma
espécie de herança que quer deixar aos seus netos e surgiu depois de uma
primeira “conversa séria com F., a sua primeira neta”. O livro serve para
explicar-lhe como é que Portugal chegou aqui?
PA - Quis, basicamente,
transmitir à minha neta, em primeiro lugar, a angústia pelo país que lhe estou a deixar, que é um
país maravilhoso em muitos aspectos, mas que está em ruína em termos institucionais. Está em ruína o
Estado, a economia também – nunca houve tanto desemprego em Portugal -, o sistema de justiça também está
muito mal, como certos sectores da educação. A segurança social também está em crise, até
a família é uma
instituição
em crise, porque hoje, em cada quatro casamentos em Portugal, há três divórcios. Pretendo identificar à minha neta as ideias
erradas que nos
conduziram
aqui e as políticas erradas que nós seguimos e que são responsabilidade da minha geração. Sinto-me
igualmente culpado. Sinto-me tão culpado por aquilo que fiz como por aquilo que não fiz, mas que
deveria ter feito para legar aos mais novos um país em melhores condições.
Renascença - Quando a sua neta F.
tiver 40 anos, como estará Portugal?
PA - Com certeza,
melhor. Neste momento, estamos mal. Demorámos muito tempo a chegar à verdade, a fazer o diagnóstico, mas, depois, quando o
decidimos mudar, temos uma capacidade extraordinária para refazer as coisas rapidamente e, portanto, quando a
minha neta for adulta, isto já mudou e estaremos melhor.
Renascença - Algumas das suas
propostas são polémicas. Teme que sejam mal interpretadas?
PA - Estou-me nas tintas
para isso, se
interpretarem
mal. Ninguém fica indiferente. Vim dizer a minha verdade e vim dizer aquilo que julgo serem as coisas boas para Portugal
e para os portugueses. Tenho uma vida a pensar nestes assuntos, ninguém me pode acusar de
ter interesses, porque não vivo do Estado, vivo de uma empresa familiar. Não há nenhum interesse se
não o bem da futura geração de portugueses.
Carlos Calaveiras na Rádio Renascença
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