O Rei é a peça mestra da Nação, realidade facilmente demonstrável,
também, a nível teórico – se não bastassem os exemplos das monarquias
constitucionais europeias contemporâneas. Sem distâncias marmóreas, o
Rei tem implicitamente em mira a felicidade do Seu Povo e o bem do País.
O Rei compartilha das preocupações do Povo, resultado de uma longa
preparação e auscultação, pois sem dar a impressão de consentir na
facilidade, como escreveu o grande Eça de Queiroz, no panegírico “A
Rainha”, «No tempo dos nossos velhos reis, ao contrário, todos os
educadores de príncipes lhes ensinavam o alto dever real de comunicar
docemente com o povo.»
O Rei não reclama da dificuldade de ler o Povo, pois, dispondo-se a tal,
porque ao seu serviço, mobiliza a Sua vontade para a leitura da
especificidade da condição humana. O Monarca perscruta, analisa cada
camada, aprende na sua verdade, e através de uma atitude racional chega
ao que acredita será o reflexo da vontade do Povo, não temendo
assumir-se como a figura que entende o espírito do mesmo. Essa é uma
tarefa infinita, que começa com a educação do herdeiro presuntivo da
Coroa, não uma realidade que se pode apreender de um momento para o
outro.
Para conhecer o Povo é necessário dirigir-se à própria matéria, face a
face, acompanhá-la, permitir a espontaneidade, sair da confortável área
da preguiça espiritual, para conhecer a «substância», e ouvindo as
pretensões mais exageradas e os anelos mais essenciais, filtrar, chocar
esses anseios e formar em consciência o que será o corpo do bem comum.
Esse escopo só pode ser alcançado pela presencialidade, pois, se não,
escapará à percepção.
Na nossa sociedade contemporânea tão igualada, já não existe
possibilidade para monarcas de trato enfatuado, e em Portugal também
raramente os houve, até porquê os príncipes eram educados pelos seus
doutos preceptores precisamente para o contrário: D. Aleixo de Menezes
acautelava El-Rei Dom Sebastião: “o excesso de afabilidade, senhor, não
compromete a autoridade do príncipe…»
«REI SEM POVO NÃO É REI, POVO SEM REI NÃO É POVO», declarou atiladamente
Dom Luís Álvares de Castro, 2.º Marquês de Cascais, tendo como
interlocutor El-Rei Dom João V.
Reinar não é um ganha-pão! A função do Monarca é personificar o carácter
nacional e nenhum Rei esquece que a sua função Real é um Ofício que
deve desempenhar com sentido de Missão. Só o Rei terá uma superior
consciência dos problemas nacionais, pois a educação de um Príncipe é
orientada da forma que se entende ser a mais adequada ao melhor
desempenho do seu futuro ofício de Rei, de forma a reinar da forma mais
útil e favorável para o País. Reinar é uma especialização na defesa dos
interesses da Nação que nunca podem ser alvo de desdém e indiferença.
A mais-valia do Monarca consiste na união entre virtude e
imparcialidade, sendo a primeira o elemento principal de que depende a
segunda.
Um Rei nunca cai no embaraço, pois mantém uma posição de neutralidade em
relação a questões políticas, sem compromissos unilaterais que ferem a
dignidade do poder moderador que se exige a um Chefe de Estado. A
política, terreno de combates sem fim, pela sua própria natureza, tem
esse destino singular de ser ferida e sobrecarregada, por questões,
interesses e lobbies partidários, económicos ou mesmo desta ou daquela
classe social. Por isso não poucas vezes o bem comum não está
suficientemente garantido. Assim a função de reinar elimina os
compromissos eleitorais e as promessas vãs e torna a chefia do Estado
digna de confiança, porque independente de calendários e lutas
eleitorais. A Monarquia funciona ainda como um símbolo de estabilidade,
união e continuidade, independentemente de calendários políticos e das
mudanças na política partidária.
Isso influiu no progresso das instituições, que auxiliadas pelo Rei
tornam as suas intenções livres da obscuridade e da contradição dos
actos. No nosso ainda novo século, como em nenhum outro antes, teve mais
na moda testemunhar o maior desprezo pela política e pelas
instituições, supostamente, democráticas, muito pelo que acontece nos
gabinetes do actual sistema, repletos de vaidade e exercendo a
autoridade achando-se detentores do poder absoluto de destruir a vontade
do Povo.
Ora, com a figura do Rei que exprime a virtude da dedicação ao bem comum
e, como tal, incapaz de iludir os cidadãos da Nação, a Comunidade vai
fazer repercutir nas instituições democráticas essa ordem. Depois pouco
mais se exigirá aos políticos, pois, recordemos as palavras do 2.º Conde
de Alvellos, em “O Berço Exilado”, «Para bem governar Portugal basta
ser – realmente – Bom, porque a Bondade dos Antigos Reis, fez deste
Povo, o melhor dos melhores povos do Mundo».
Miguel Villas-Boas
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