Um país não vive do seu passado. Mas tem que manter viva a sua
memória. Porque se é verdade que a História não se repete, é verdade
também que determinadas situações, determinadas decisões, determinados
actos, devem servir de fonte de reflexão para quem constrói o presente
pensando no futuro. E esse presente e esse futuro somos nós que o
construímos a cada momento, através das instituições e das pessoas que
escolhemos para em nosso nome exercerem o poder político.
Não só
de grandes feitos, de grandes vitórias, de grandes avanços
civilizacionais, de grandes homens e mulheres é feita a História de um
povo. Também de derrotas, de retrocessos, de erros, de fracassos e de
pessoas que marcaram negativamente os vários passos na caminhada
colectiva. Mas é importante, diria mesmo imprescindível, recordar e
assinalar os momentos altos, os momentos fundamentais do nosso
património comum. Sobretudo daqueles que nos unem como povo e como Nação
multicentenária.
Portugal é um dos países – talvez porque
nasceu há quase novecentos anos – que não comemora, porque não recorda, a
sua fundação. O seu dia nacional não é o da sua fundação como Estado
independente, mas o dia em que um poeta maior que exaltou a Pátria
morreu, nas vésperas da perda da independência. Uma “invenção” da
república nascente, onde se não poderia e quereria evidenciar qualquer
acto que tivesse no rei o seu actor. Países mais recentes como os
Estados Unidos da América ou o Brasil, têm no dia da independência o seu
dia maior. Porque valorizam o momento histórico em que, como povo,
puderam tomar o destino nas suas próprias mãos.
Os dias em que,
por decisão da República, festejamos momentos nacionais de exaltação e
de memória são, para além do dia de Portugal, que também já foi de
Camões, da Raça e agora é das Comunidades Portuguesas o 1º de Dezembro,
durante a Monarquia o principal feriado cívico, que não tem sequer
comemorações a nível nacional e se fica por cerimónias oficiais em
Lisboa, duas datas que recordam a divisão dos portugueses em vencedores e
vencidos: a implantação da República e o 25 de Abril. A fundação de
Portugal não mereceu do poder político o menor entusiasmo patriótico.
Num
momento histórico em que Portugal se debate com uma crise económica e
social muito grave, em que muitos portugueses se vêem constrangidos a
trocar o país por outros onde as suas justas expectativas de realização
pessoal, ou tão só de sobrevivência com dignidade, sejam possíveis, onde
a descrença, o abatimento, a revolta contra as instituições e os
governos dominam o dia-a-dia, é fundamental comemorar o acto que nos
uniu como povo e como Estado soberano, o momento em que Portugal nasceu,
o acto que nos projectou no futuro como Nação independente.
Por
isso os portugueses monárquicos vão recordar e enaltecer o dia em que
pelo Tratado de Zamora, em 1143, o rei de Castela reconheceu a nossa
independência, homenageando o rei que obteve pelas armas esse
reconhecimento, Dom Afonso Henriques. Em Coimbra, no panteão nacional da
Igreja de Santa Cruz, no dia 5 de Outubro. Um dia que será diferente
porque recorda e evidencia o que nos une e não os que nos divide.
João Mattos e Silva(*) in Diário Digital (19-Set-2011)
(*) Presidente da Real Associação de Lisboa e Ex-Presidente da Causa Real
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