A Causa Real não é um Partido, nem
existe para ser um centro conspirativo para derrube violento de
qualquer uma das Repúblicas que temos vivido. Embora no seu alvorecer
tenha representado a revolta que se levantou contra a prepotência do
estado de coisas instalado pela força em 1910, o passar dos anos
levaram-na a enveredar pelo caminho da marcação de uma presença
constante, aquele prudente mas firme sinal de aviso a uma certa forma de
ver Portugal. Atravessou períodos de maior notoriedade e no início da
década de 50, houve momentos em que pareceu muito perto de conseguir o
propósito da restauração da Monarquia em Portugal. As gerações
sucederam-se e com elas, a forma de pensar a sociedade que era própria
do tempo.
Quem visite os numerosos sites monárquicos na blogosfera ou no Facebook,
poderá verificar uma certa impaciência pela "inacção" da Causa,
entendendo-se equivocadamente o seu papel, como uma sede aglutinadora à
imagem de um Partido político e neste caso, o único corpo visível que
combate o regime. Nada de mais errado. A verdade é que por muitos
milhares de filiados que tenha - e tem-nos, agrade ou não agrade este
facto "aos do sistema" -, a Causa não quer, não pode e nem sequer tem
como fim, a imitação espúria daquele que um dia se chamou PRP.
Diferentemente dos republicanos decididos pela destruição de uma
Monarquia que julgavam ser por si a razão das desgraças nacionais, a
Causa Real concita a simpatia e a participação nas suas listas, de
milhares de portugueses com as mais díspares opiniões políticas,
avultando nomes bem conhecidos do actual regime. "Inimigos" nos
pressupostos partidários, aliados no grande objectivo comum. Será ainda
necessário sublinhar, a progressiva adopção pelo chamado mainstream
do actual regime, de muitos dos mais importantes postulados veiculados
pela Casa Real, através da pública tomada de posição por elementos a ela
ligados e que nas academias ou imprensa, têm indicado caminhos a
trilhar para o bem comum: quem recorde qual era o posicionamento dos
monárquicos quanto à descolonização, o caso de Timor, os Tratados
assinados com a então CEE, a política portuguesa na geoestratégia do
Atlântico ou da aproximação política e económica aos países da CPLP,
facilmente reconhecerá este mérito que não pode ser negado. Por muito
que isso desagrade aos "aflitos do regime", esta é a verdade que a
poucos escapará.
Outro dos equívocos consiste na alegada
"blindagem" da CR à livre participação dos seus filiados - que na
maioria não são de forma alguma "militantes" - nos órgãos dirigentes. Há
que notar o facto da CR ser um braço daquilo a que em sentido amplo se
chama o gabinete da Casa Real, não podendo ser por isso, sujeita a
golpes de aventureira oportunidade que se verificam noutro tipo de
organizações, nomeadamente certos partidos políticos. Se as eleições são
completamente livres, a escolha dos dirigentes deverá ser sempre
objecto da aquiescência real e este aspecto é tão relevante quanto a
existência da própria Causa e das suas ramificações plasmadas nas Reais
Associações. Alguns sectores mostram-se impacientes e clamam por acção!,
sem que essa prometida azáfama seja plenamente explicada á generalidade
daqueles que se reclamam de monárquicos. Assim sendo, como será
possível passar a Causa a tomar posições de recorte partidário no âmbito
da política nacional, sem que isso implique a sua transformação num
Partido político? É evidente e desejável o surgimento de múltiplas
organizações que pretendam "ir a eleições gerais" e que incluam nos seus
programas, aquela medida essencial que implica a reconstrução do
Estado: a opção pela Monarquia. No entanto, tal não pode ser exigido à
Causa Real, por muito que isso desgoste muitos dos seus filiados que
aliás, nela encontram pares que obedecem a outras linhas de acção e
mais importante ainda, de pensamento. Se existe gente válida nos
Partidos, poderão os militantes subir às respectivas tribunas e do alto
proclamarem o seu apego à necessidade da restauração da Monarquia. No
PS, no PSD, no CDS, BE ou qualquer outro, seria um inestimável serviço
prestado, organizando tendências e grupos de pressão. Essa é a ideia
chave.
Sendo de uma geração muito distante
daquela que fundou a então Causa Monárquica, parece-me de elementar
justiça, reconhecer o trabalho porfiado que os fundadores e seus
imediatos sucessores tiveram para a manutenção da chama. Critiquem-se os
Integralistas, desdenhe-se agora o labor dos genealogistas ou dos
"loucos pela Bandeira", há que concluir terem sido eles os homens que
impediram a extinção da ideia do princípio monárquico da organização do
Estado português. Acabaram por muito contribuir para o derrube da
ditadura "democrática" dos Costas e Bernardinos, fincaram o pé e
irritaram Salazar e Marcelo Caetano e abriram as portas à renovação da
Causa nos anos 60, acabando por adequar a ideia da Restauração, a algo
perfeitamente normal e exequível no plano dos princípios. Se tal não foi
até agora conseguido, isso dever-se-á às contingências dos diversos
períodos que têm pautado a vida da actual "situação" e que mais terão a
ver com os interesses que durante anos, têm encontrado amplo respaldo
além-fronteiras, traduzindo-se isto no eterno numerário que faz
amodorrar a vontade de tantos. Uma época que está a chegar ao fim.
A Causa Real podia fazer mais? Decerto.
Para isso, seria necessária a total dedicação de todos os filiados e a
sujeição ao vai-vem das conferências, reuniões fora da cidade de
residência e do trabalho, a contribuição com uma parte, mesmo que
ínfima, do património de cada um. Ora, isso é o que tem acontecido no
muito restrito núcleo dirigente da CR, com o claro sacrifício da
tranquilidade da vida familiar e do incontornável recurso às contas
bancárias de cada um. Faz-se o que e possível e esse é o papel daqueles
que se encontram filiados na organização. Ser membro* implica deveres, não apenas o iniludível direito de criticar.
Os regimes constitucionais vão passando e
a Causa lá continua, como sempre na mesmíssima localização. Se tempos
houve em que parecia perto da extinção, hoje é um testemunho daquilo que
por ela fizeram as gerações dos nossos bisavós, avós e pais. E assim
continuará, para grande irritação de alguns nossos "inimigos".
* Não sou filiado na Causa Real.
Publicado por Nuno Castelo-Branco em Estado Sentido
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