
Com
a morte, em 1925, do autor de «Ao Princípio era o Verbo», perdeu, sem
dúvida, o nacionalismo português um dos seus mais altos representantes e
um dos seus mais ardorosos doutrinadores.
Educado no culto dos
Direitos do Homem e na admiração entusiástica dos Imortais Princípios,
António Sardinha, perante o espectáculo irrisório do Constitucionalismo,
foi republicano e revolucionário. A falência catastrófica e anárquica
do regime implantado a 5 de Outubro veio, porém, destruir as suas
ilusões e quimeras. Tinha chegado a hora angustiosa da crise interior.
Diante
das realidades ele, como tantos outros jovens da sua geração, fez o seu
exame de consciência. Qual o valor dos ideais até então professados?
Quais as causas de desordem? Como salvar Portugal? Que caminho seguir? A
essas perguntas perplexas, Sardinha não tardou a dar resposta. Maurras,
Barrès, Daudet, Taine, Renan, Agostinho de Macedo, Gama e Castro, o
Marquês de Penalva, ensinaram-lhe a crítica à Democracia, ao
Liberalismo, o apreço às elites, o amor à realidade. Gama Barros,
Alberto Sampaio, os eruditos da Portugália, o estudo das crónicas, de
velhas memórias, trouxeram-lhe uma nova visão da história, uma nova
compreensão da origem e do destino do país. Tendo encontrado a Verdade,
Sardinha não hesitou um momento. Na companhia do grupo ardente de
rapazes que constituía então o Integralismo, lançou-se, através das
páginas da «Nação Portuguesa», no mais aceso combate.
À oposição
clássica: Liberdade ou Autoridade, respondia que a Liberdade sem a
Autoridade era um absurdo pois a primeira, proclamando-se um valor,
implicitamente estava atribuindo a si mesma Autoridade. E, contra o
Individualismo, traçava o esboço da síntese entre estes dois falsos
contrários, por meio da noção viva e criadora da Ordem que atribui a
cada coisa o seu lugar; da Ordem realizada na Monarquia integral com o
Rei ao alto federando e unindo energias, com os municípios, as
províncias e as corporações autónomas na sua esfera, toda esta grandiosa
hierarquia desenvolvendo-se, fluindo e formando, na inseparabilidade do
soberano com os diversos agregados, o formidável todo que é a Pátria.
Às
calúnias e deturpações dos escritores liberais, discípulos dilectos da
Maçonaria, respondia, triunfalmente com as provas na mão, lançando
abaixo do pedestal o falso mártir Gomes Freire, combatendo a nefasta
acção do Marquês de Pombal, reabilitando a memória dos nossos reis, de
João IV, D. Miguel I, D. João V, D. Sebastião, D. Fernando, atacando a
obra da Carta Constitucional, provando quão de falso havia na lenda de
uma suposta tirania existente até ao radioso ano de 1820, demonstrando
como não tinham fundamento as acusações injuriosas e difamantes que
pesavam sobre a Inquisição e os Jesuítas, etc.
Aos tímidos
conservadores, que se insurgiam contra os extremismos, quer das
esquerdas quer das direitas, aos defensores puros do existente, aos
monárquicos que se limitavam a combater a República comparando o valor
dos estadistas de antes de 1910 com o mérito dos de depois de 1910, aos
que repeliam a doutrina como luxo ou a reduziam a palavras vagas, a
esses todos fazia a apologia de Sorel e da violência, proclamava o
direito do pensamento dirigir a acção, afirmava a existência de
princípios objectivos a defender e a exaltar. E com a energia para
repelir os apelos escandalizados da burguesia exclamava: «O nosso
movimento é fundamentalmente um movimento de guerra».
Aos que
apelavam para as memórias gloriosas dos eminentes espíritos do século
dezanove, ele, sem hesitação, repelindo preconceitos extraía o sentido
contra-revolucionário subjacente nas obras de Herculano, Garrett,
Oliveira Martins, Antero, Ramalho, Eça, e, sem os erros, por vezes
graves, de tão grandes vultos, enquadrava-os no momento histórico que
lhes cabia, explicando o significado dos seus ataques e das suas
ironias, significado bem mais alto que o atribuído pelo fácil
jacobinismo da época.
Aos defensores sentimentais ou interessados do
Judaísmo ele mostrava, com Sorel e Sombart, a nefasta influência
exercida pelo espírito talmúdico na economia europeia, a
responsabilidade que lhe competia no desenvolvimento e na frutificação
da Plutocracia, da agiotagem, da avidez desenfreada de lucro. E assim,
de cara descoberta, ele combateu os mitos sem transigir, sem pactuar com
uma glória ou um comodismo tranquilo.
Não nos deixou uma vasta obra
sistemática; não nos deixou uma doutrina de cânones estabelecidos; mas,
se não compôs tratados no remanso dum gabinete, legou-nos a lição
incessante dum combate sem tréguas de nacionalista desinteressado. Com o
auxílio dos seus companheiros do Integralismo, com Mariotte e com o
inquebrantável e enérgico Alfredo Pimenta, conseguiu Sardinha levar a
cabo uma das mais notáveis revoluções espirituais do nosso tempo. Por
isso, enquanto houver portugueses, jamais será olvidado o seu
apostolado, expressão clara, manifestação gloriosa da vitalidade perene
do Génio da Raça.
Por isso o invocamos hoje, nós os que lutamos pela
mesma eterna verdade da Pátria e do Rei, certos de que não faltará à
chamada e de que o seu espírito nos acompanhará.
António José de Brito in O Diabo, nº 1826, 27 de Dezembro de 2011.
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