Golpe
de Vista, em que compendio, mas em luz clara, e brilhante se propoem as
razões, e fundamentos, que demonstrão, a ponto de evidencia, a
Legitimidade dos Direitos d'ElRei o Senhor Dom Miguel I. Ao Throno de
Portugal..., em 10 de Março de 1829. [Obra atribuída a Frei Fortunato de
S. Boaventura].
(...)
"Todas
as razões, ou fundamentos dos Direitos do Senhor D. Miguel ao Throno de
Portugal podem commodamente, para sem dificuldade se perceberem em hum
ponto de vista, reduzirem-se a duas classes: Primeira, das que
demonstrão com evidencia a justiça da exclusão do Senhor D. Pedro, seu
irmão mais velho, da Sucessão ao mesmo Throno. Segunda, das que
demonstrão em igual evidencia a legitimidade da Accessão do Senhor D.
Miguel aquella Sucessão pela exclusão do Senhor D. Pedro. As razões, ou
fundamentos da 1ª classe também se podem reduzir a seis e as da 2ª
classe a outras seis; mas as seis da 1ª classe acrescentarei mais três,
menos decisivas, mas subsidiárias, e de grave reforço.
1ª PARTE
Em
1ª classe = Razões, que decidem incontestavelmente a exclusão do Senhor
D. Pedro, não obstante a sua naturalidade, e Primogenitura.
O
Senhor D. Pedro, bem que nascido em Portugal, e primogénito do Senhor
Rei D. João VI, perdeo os Direitos, que huma, e outra qualidade lhe
davão á Coroa de Portugal.
1º
Porque muito por seu querer e escolha se fez Estrangeiro a Portugal,
passando a ser Soberano independente, e Imperador do Brasil, tendo-se
por isso desligado este absolutamente de Portugal.
2º
Porque o Senhor D. Pedro, Filho, e Vassallo do Senhor D. João VI Rei de
Portugal, não só aprovou, e favoreceo a Rebellião do Brasil, mas se
apresentou á testa dos Rebeldes, e Revolucionários, como seu Chefe;
desmembrou do Reino de Portugal aquella importantíssima Colónia, elevada
por seu Pai á qualidade de Reino; e até se declarou a si próprio
solemnemente perpetuo Defensor do paiz rebellado.
3º
Porque os Senhor D. Pedro, além de separar da Mãi Pátria aquelle
Estado, fez declarada guerra offensiva a Portugal, sua Patria; e tudo
isto para sustentar a Rebellião do Brasil, e a desmembração, e usurpação
de huma dos mais interessantes, e consideraveis Dominios de Portugal.
4º
Porque o Senhor D. Pedro propoz-se, empenhou-se, e fez quanto em si
estava, para por meio da sua Carta Constitucional, que mandou jurar em
Portugal, desmanchar, e destruir arbitrariamente as Leis fundamentais
deste Reino, e o que havia de mais venerável em suas Instituições, assim
pela sua antiguidade, e inalterável observância, como pelas suas
vantajosas, e experimentadas utilidades.
5º
Porque o Senhor D. Pedro, como Imperador do Brasil, se obrigou a
residir sempre no Brasil, e não pode vir residir em Portugal; residência
esta absolutamente indispensável para poder succeder na Coroa de
Portugal.
6º Porque o
Senhor D. Pedro mesmo positiva, e expressissimamente declarou que nada
queria de Portugal, e até reconheceo mui solenemente que, sendo
Imperador do Brasil, não podia ser Rei de Portugal.
Accrescem porém ainda sobre tudo isto tres razões subsidiarias, que não devem ficar em silencio.
1ª O Senhor D. Pedro nem em Portugal, nem no Brasil foi acclamado Rei de Portugal.
2ª
O Senhor D. Pedro não... prestou o Juramento de guardar aos Portuguezes
seus Privilégios, Liberdades, Foros, graças e costumes, que as Leis
Fundamentais da Monarchia mandão que os Reis de Portugal prestem antes
de serem levantados Reis, e antes que os Estados do Reino lhe prestem o
Juramento de preito, e homenagem.
3ª
Ainda no caso de se poder suppôr legitimada pelo Senhor Rei D. João VI
no Tratado de 29 de Agosto de 1825 a usurpação, e levantamento do Brasil
em Império independente: caso puramente ideal, e de mera supposição,
esse caso seria justamente o que previrão as Côrtes de Lisboa de 1641,
dizendo: que se acontecer succeder o Rei deste Reino em algum Reino, ou
Senhorio maior... e tendo dous, ou mais filhos varões, o maior succeda
no Reino estranho, e o segundo neste de Portugal; e este seja jurado
Príncipe, e Legitimo Sucessor...
2ª PARTE
E
2ª classe de razões, ou argumentos. Razões que demonstrão em evidencia a
legitimidade da Accessão do Senhor D. Miguel à Successão da Corôa de
Portugal, pela exclusão do Senhor D. Pedro.
O Senhor D. Miguel tem legitimo, e rigoroso direito á Corôa de Portugal
1º
Porque excluido justamente della o Senhor D. Pedro por tantas, e tão
incontrastaveis razões, que ficão ponderadas, elle he o Filho segundo
vivo (a) do Senhor Rei D. João VI, e o irmão immediato do Senhor D.
Pedro, em quem a mesma Corôa pelas Leis fundamentaes da Monarchia (b)
necessariamente recahe.
2º
Porque o Senhor D. Miguel não só nasceo, e foi creado em Portugal, como
expressamente requerem as Côrtes de Lisboa de 1641; mas nunca perdeo,
nem de facto, nem de Direito (c), os direitos da sua naturalidade, nem
os renunciou expressa, ou tacitamente, naturalisando-se em Paiz
estranho, fazendo-se Estrangeiro.
3º
Porque o Senhor D. Miguel aos direitos da sua naturalidade, e immediata
Successão, como segunda Linha reune o da sua residencia actual, firme, e
permanente em Portugal, sem se achar ligado por vinculo algum a outra
residencia fora delle, e por isso por felicidade deste até aqui
desafortunado Reino, não ha, nem pode haver a mais leve desconfiança de
que este seu verdadeiro Libertador, e Restaurador (d) jámais o deixe, e
abandone.
4º Porque
assim a exclusão do Senhor D. Pedro da Corôa de Portugal, como todos os
indicados Direitos do Senhor D. Miguel, depois do mais exacto exame, e
discussão forão reconhecidos, e declarados legitimos, e indubitaveis do
modo o mais unanime (e) e solemne pelas Côrtes verdadeiramente
Portuguezas de Lisboa de 11 de Julho de 1828 pelos tres Braços, ou
Estados do Reino, Clero, Nobreza e Povo, de cuja privativa competencia
he toda a que tem sobre a Successão do Reino (f).
5º
Porque o Senhor D. Miguel se tem exactamente preenchido todas as
Solemnidades, que as Leis fundamentaes de Portugal requerem para a
legitima exaltação de seus Soberanos ao Throno, além das que se apontão
na razão antecedente, o Senhor D. Miguel nas sobredictas Côrtes de
Lisboa de 1828 prestou o Juramento de Reger, e Governar bem, e
direitamente o Povo Portuguez, de administrar-lhe Justiça, e de lhe
guardar seus Bens, Foros, Privilégios, Liberdades, e bons costume; e em
consequencia tambem os tres Braços, ou Estados do Reino alli reunidos,
lhe prestárão ao mesmo o Juramento de preito, e homenagem (g).
6º
E ultimamente porque o Senhor D. Miguel sobre legitimos, e rigorosos
direitos, e legaes Solemnidades da Posse effectiva, em que está da Corôa
de Portugal, Posse, que desde o feliz dia de 22 de Fevereiro de 1828,
em que entrou neste Reino, na sua volta de Vienna d'Austria, lhe foi
logo dada pela espontanea, e geral Acclamação do Povo Portuguez (h)
quatro mezes antes da Celebração das Côrtes, e do Reconhecimento, e
Declaração, que ellas fizerão da Justiça, e legitimidade daquelles mesmo
Direitos, os quaes independentemente de tal Reconhecimento, e
Declaração per si evidentes e incontestaveis (i); Posse, e Acclamação,
que depois das Côrtes os Portuguezes não tem cessado de repetir, e
confirmar com o maior entusiasmo, mostrando verbal, e praticamente (j)
com os testemunhos mais decisivos, e com os sacrificios mais difficeis, e
penosos que se felicitão de terem o Senhor D. Miguel I por Soberano,
que, ainda que por Direito o não fosse, o querião por escolha, e não
querem outro algum Rei, e Soberano.
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