Que
os espanhóis achem uma vergonha que Gibraltar continue britânica ao fim
de três séculos é lá com eles, que ignorem Olivença é connosco. Fez
sábado anos que o Tratado de Utreque formalizou a cedência do rochedo e
não faltaram nos jornais palavras de indignação sobre a recusa dos
britânicos em reconhecer que se trata de um empréstimo, não de cedência
de soberania. E que o texto de 1713 prevê a devolução e nunca o direito
dos gibraltinos a decidir, como se defende em Londres, sobretudo após os
referendos adversos às intenções espanholas.
São sólidos os argumentos de figuras como Martín Ortega, da Complutense, no El País.
Até sobre a apropriação abusiva do istmo, pedaço de terra não citado no
tratado que pôs fim à Guerra da Sucessão Espanhola, que levou ao trono
os Bourbon, antepassados de Juan Carlos. Mas nem uma palavra sobre a
questão de Olivença, território reclamado até hoje por Portugal, depois
de cedido em 1801 mas recuperado, à luz do direito internacional, pelo
Tratado de Viena de 1815.
Como costuma notar com malícia a
imprensa londrina, se há paralelismos nisto de contenciosos com toque
ibérico é entre Gibraltar e Olivença. Verdade, pois Ceuta é um caso à
parte.
Que aconteceu para Olivença passar a Olivenza? Uma invasão
quando os espanhóis ainda serviam Napoleão e este não perdoava aos
portugueses serem leais à Inglaterra. Derrotado o francês, as potências
impuseram a devolução dessas terras para lá do Guadiana. Espanha fez-se
de surda e com o franquismo triunfaria a castelhanização, ficando-se os
vestígios de Portugal pela arquitectura manuelina e a calçada. À parte o
Grupo dos Amigos de Olivença e uma ou outra atitude simbólica do Estado,
por cá pouca atenção se tem dado ao diferendo.
Londres e Madrid
chegaram a negociar em vão o futuro de Gibraltar, uma mini-Inglaterra
com varanda para África. Espanhóis e portugueses foram mais pragmáticos:
como dos governantes pouco podem esperar, seja em Madrid ou Lisboa, os
oliventinos, agora extremenhos, dão-se bem com os alentejanos e
aproveitam o já não haver guardas-fronteiriços. Voltou-se até a estudar o
português e junto aos nomes espanhóis as ruas recuperaram as velhas
placas.
por LEONÍDIO PAULO FERREIRA
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