Santa Joana Princesa, Padroeira da cidade e diocese de Aveiro
5/1/1965 – 5/1/2015
«Caminhante, não há caminho: faz-se caminho ao andar». Estas
palavras do poeta valem para os viajantes e para o homem inquieto que
procura novas metas e os caminhos que a elas conduzem. O cristão tem
clara a sua meta e sabe que Jesus é o caminho. Por isso, propõe-se
seguir os Seus passos.
Se alguém quiser seguir-Me…
Celebramos hoje os cinquenta anos da
declaração oficial de Santa Joana Princesa como padroeira da cidade e da
diocese de Aveiro. Ela, tal como nos propõe o Evangelho de S. Mateus (Mt
16, 24-27), é um exemplo claro para cada um de nós, de como a sua vida
foi um caminho de perfeição e santidade. Diz-nos S. Mateus que a partir
da confissão messiânica de Pedro em Cesareia de Filipe, Jesus
começou a fazer ver aos seus discípulos que tinha de ir a Jerusalém e
sofrer muito, da parte dos anciãos, dos sumos-sacerdotes e dos doutores
da Lei, ser morto e, ao terceiro dia, ressuscitar» (Mt 16, 21). Depois, dirigindo-se aos seus discípulos, disse-lhes: «Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo» – significa que devemos adoptar os mesmos sentimentos de Cristo; «tome a sua cruz» – esforçar-se heroicamente para seguir Jesus (ainda que implique a morte), «e siga-me» – a nossa fidelidade passa pela mesma fidelidade de Jesus à vontade do Pai.
Seguir Cristo não é apenas uma opção de circunstância, mas sim uma acção permanente: Quem quiser salvar a sua vida por minha causa, há de encontra-la. A
lógica do salvar ou perder a vida que Jesus nos propõe é a mesma que
Ele viveu: há mais alegria em dar do que em receber, e o Filho do Homem
não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida. Por isso, «de que serve ao homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder a sua vida? A vida é o valor supremo que Deus nos dá e que devemos colocar ao serviço dos irmãos, dos outros.
Olhando para a vida de Santa Joana, não é
difícil vermos como as palavras de S. Paulo aos cristãos de Filipos se
concretizam na nossa Padroeira. Filha do rei D. Afonso V e herdeira do
trono, «considerou todas as coisas como prejuízo, por causa da maravilha que é o conhecimento de Cristo Jesus, seu Senhor»; habituada ao ambiente do palácio real, «renunciou a todas as coisas a fim de ganhar a Cristo»;
a sua vida não se baseou nem nas riquezas, nem nas inúmeras propostas
de casamento com vários príncipes de casas reais europeias, mas sim em «conhecê-lo a Ele, na força da sua ressurreição e na comunhão com os seus sofrimentos»; veio para o Mosteiro de Jesus, em Aveiro, com a consciência clara de que ainda não tinha atingido a meta, mas para «continuar a correr, para ver se a alcançava».
A sua vida, não a devemos entender em
sentido negativo, de renúncia, mas sim com carácter positivo, como
imperativo de perfeição cristã, de desenvolvimento das exigências do
baptismo e do seguimento de Jesus Cristo: «Uma coisa faço;
esquecendo-me do que fica para trás, corro em direcção à meta, para o
prémio a que Deus, lá do alto, nos chama em Cristo Jesus».
A vida consagrada é como uma árvore que
se desenvolve de forma admirável e frondosa no campo do Senhor e, a
partir de uma semente lançada por Deus, vai-se desenvolvendo e
aperfeiçoando nas mais variadas formas que a constituem. A vida
consagrada, «pela profissão dos conselhos evangélicos, é a forma
estável de viver, pela qual os fiéis, sob a acção do Espírito Santo,
seguindo a Cristo mais de perto, se consagram totalmente a Deus
sumamente amado, para que, devotados por um título novo e peculiar à Sua
honra, à edificação da Igreja e à salvação do mundo, alcancem a
perfeição da caridade ao serviço do reino de Deus e, convertidos em
sinal claro na Igreja, anunciem a glória celeste» (CIC 573).
Santa Joana Princesa, modelo de santidade
Pelo baptismo, os cristãos são chamados à
santidade, imitando Cristo na vida de cada dia. O Concílio Vaticano II
exprime isto mesmo ao afirmar que «os seguidores de Cristo, que Deus
chamou e justificou no Senhor Jesus, não pelos méritos deles mas por
Seu desígnio e Sua graça, foram feitos, no Baptismo da fé, verdadeiros
filhos de Deus e participantes da natureza divina, e por isso mesmo
verdadeiramente santos» (LG 40).
A presença de irmãos e irmãs nossos, que
a Igreja reconhece como santos, sempre teve muita influência na vida
daqueles que os conheceram e foram seus discípulos. A santidade
interpela a vida cristã, porque ela é um reflexo da beleza de Deus no
mundo. Se Jesus é o rosto visível do Deus invisível (Col 1,
15), os santos são o rosto visível do amor de Deus por nós. Os vários
carismas não são outra coisa que modos de aproximação ao mistério de
Deus nas suas várias dimensões. A uns deu a graça do perdão, a outros a
compaixão para com os pobres, a outros a ânsia de serem evangelizadores e
trabalharem pela dignidade do ser humano… mas todos contribuem para
apresentar a beleza de Deus em todas as suas formas. Os santos são
aqueles que, com a sua vida, fizeram santos à sua volta. Este é o maior
critério de uma vida santa: «A vida daqueles que seguiram fielmente a
Cristo é um novo motivo que nos entusiasma a buscar a cidade futura e,
ao mesmo tempo, nos ensina um caminho seguro, pelo qual, por entre as
efémeras realidades deste mundo e segundo o estado e condição próprios
de cada um, podemos chegar à união perfeita com Cristo, na qual consiste
a santidade» (LG 50).
Santa Joana Princesa, um dom para a Igreja de Aveiro
Iniciamos hoje a celebração dos 50 anos
da declaração de Santa Joana Princesa, como padroeira da cidade e da
diocese de Aveiro, através da Bula Sanctitatis Flos (A Flor da Santidade), assinada pelo Papa Beato Paulo VI, em 5 de Janeiro de 1965.
«Nós, de muito bom grado resolvemos atender ao pedido (do bispo diocesano D. Manuel de Almeida Trindade),
no desejo de premiar condignamente tão piedosa devoção popular. (…)
Declaramos a Beata Joana, Princesa de Portugal, como Padroeira junto de
Deus para a cidade e para toda a diocese de Aveiro, com todas as honras
anexas e privilégios que legalmente competem aos padroeiros principais
dos lugares».
Sabemos da dificuldade em a Igreja
reconhecer a santidade dos seus filhos, propondo-os como modelos e
dignos de veneração. Por isso, os Processos de Beatificação e
Canonização são demorados e exaustivos na análise da vida e obra dos
bem-aventurados. A bem-aventurada Joana Princesa foi declarada beata
pelo Papa Inocêncio XII, a 4 de Abril de 1693 e, desde então, foram
várias as tentativas em ordem à sua canonização. Não posso deixar de
realçar o Processo organizado e enviado para Roma em 1753 e o voto
formulado pelo Senhor D. Manuel de Almeida Trindade, na nota pastoral de
7 de Abril de 1965, quando deu, à diocese, a notícia do patrocínio de
Santa Joana sobre a cidade e a diocese de Aveiro: «Oxalá este facto
venha a despertar ainda mais, não só na cidade mas ainda em toda a
Diocese, a devoção a Santa Joana, e em breve possamos ver concluído o
processo da sua canonização».
Ouvido o parecer do Provincial da Ordem
Dominicana em Portugal, presente nesta celebração, e correspondendo aos
anseios de várias instituições diocesanas e da sociedade civil,
regozijo-me ao comunicar à diocese que iremos reabrir o Processo de canonização da Princesa “Santa” Joana, tendo presente dois objectivos fundamentais:
1º Centrando-nos neste ano dedicado à
vida consagrada, queremos olhar mais profundamente para esta religiosa
que viveu grande parte da sua vida na nossa cidade e cujo túmulo se
encontra entre nós. Em tempos de perda progressiva de valores morais, do
enfraquecimento da fé em muitos dos batizados… Santa Joana é modelo
eloquente de que só Deus basta (S. Teresa de Ávila) e por Ele vale a
pena deixar pai, mãe, esposa, filhos, casa, campos e até a própria vida,
para ser discípulo de Jesus (Lc 14, 26).
2º Só podemos amar aquilo que
conhecemos. A intensificação do Processo canónico em ordem à sua
canonização deve ser ocasião propícia para conhecermos melhor a vida e
obra de Santa Joana: as razões que a levaram a ingressar no Mosteiro de
Jesus, o amor à paixão de Cristo como expressão máxima do amor de Deus, o
testemunho de uma vida simples e humilde, o amor aos mais pobres da
cidade de Aveiro… intuitos que devem ser um desafio à nossa vida cristã.
Deus, na e pela vida das suas criaturas, merece a nossa vida e os
nossos trabalhos.
Santa Joana Princesa de Portugal e Padroeira da cidade e diocese de Aveiro
Senhor, Pai santo e fonte de toda a santidade,
nós Vos louvamos e damos graças,
porque enriquecestes a vossa Igreja
com a vida da bem-aventurada Joana Princesa,
que testemunhou simplicidade, humildade,
devoção à paixão de Cristo e amor ao próximo.
Fazei que nós, vossos servos,
superando a sedução dos bens terrenos
e de coração purificado,
imitemos as suas virtudes
e alcancemos o reino dos Céus.
Por sua intercessão, concedei-nos as graças
que Vos pedimos (nomeadamente a de…)
e o dom da sua canonização.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,
que é Deus convosco
na unidade do Espírito Santo.
Ámen.
Aveiro, 5 de Janeiro de 2015.
+ António Manuel Moiteiro Ramos, Bispo de Aveiro.
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