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A CAUSA REAL NO DISTRITO DE AVEIRO

A CAUSA REAL NO DISTRITO DE AVEIRO
Autor: Nuno A. G. Bandeira

Tradutor

segunda-feira, 13 de março de 2023

1º CONDE DE BASTO, JOSÉ ANTÓNIO OLIVEIRA LEITE DE BARROS, (1749-1833)

Nasceu a 3 de Setembro de 1749 em S. Gens, freguesia de Fafe e morreu a 4 de Agosto de 1833 em Coimbra, de cólera-mórbus, com 84 anos incompletos. Era filho legitimado de André de Oliveira Leite de Barros (senhor da Casa de Breia, de Basto) e de Brígida do Vale. Resta saber até que ponto tal ascendência adulterina o terá marcado psicologicamente, dado o carácter ferozmente persecutório que assume a sua existência terrena. Era seu tio o desembargador do Paço João de Oliveira Leite de Barros (nomeado para esse tribunal supremo do reino em 1778), deputado da Mesa de Consciência e Ordens (1767) e desembargador da Casa da Suplicação), que o terá influenciado, porventura, nas visões políticas conservadoras. Em 1780 José António Oliveira Leite de Barros conclui a licenciatura em Direito na Universidade de Coimbra (com a idade relativamente avançada de 30 anos), ingressando, de seguida, na carreira judicial. Logo em 1784 torna-se desembargador da Casa e Relação do Porto, permanecendo, durante uma década, num relativo anonimato. Em 1788 casa com a sua parente Leonor Ângela Leite de Barros, matrimónio do qual nasce João António de Leite Oliveira Pereira de Barros (1789-1859), criança com problemas mentais. Já perto dos 45 torna-se primeiro desembargador ordinário, depois também dos Agravos da Casa da Suplicação (em 1794 e 1799), provedor fiscal da Junta dos Três Estados (1800), desembargador do Paço em 1805 e no ano seguinte juiz relator do Conselho de Justiça do Almirantado. Em Setembro de 1812 é decidido que presidirá à junta que na Torre do tombo se reúne para examine os forais para a respectiva reforma (Nogueira 2012, p. 192). Essa ascensão e preponderância na magistratura judicial e na cena pública permitem que, em 1817, seja juiz adjunto no sinistro processo de Gomes Freire (Lopes 2003, p. 98). Em 1805 recebera, ainda, o Título de Conselho e de Juiz Geral das Reais Coutadas (Subtil 1996, pp. 506 e 519 e Subtil 2010, p. 327). Em 1819, como recompensa pelo seu papel na participação no processo judicial que culmina na morte do tenente-general Gomes Freire de Andrade, Leite de Barros é recompensado com a mercê do senhorio do concelho de Rossas, da alcaidaria-mor de Guimarães e das comendas de São Nicolau dos Vales e de Santa Comba de Orelhão. Já outros esbirros da repressão da liberdade de pensamento e de expressão, como João Gaudêncio Torres e João de Matos Barbosa de Magalhães, assim como um filho de António Gomes Ribeiro, receberam comendas pelas mesmas razões (neste último caso, uma de Cristo, do próprio Gomes Freire, Protásio 2019, p. 210).

Existe, por outro lado, um insuspeitado paralelismo e proximidade entre duas figuras importantes da época, o 1º visconde de Santarém e o 1º conde de Basto (titulados em 1811 e 1829, respectivamente). Enquanto João Diogo de Barros Leitão e Carvalhosa é nomeado administrador particular da Casa do Infantado a 2 de Maio de 1803, a 8 de Maio José António de Oliveira Leite de Barros é designado deputado da Casa do Infantado. A 18 de Agosto de 1807, João Diogo de Barros, “que servia de Secretário do Infantado”, participa num conselho de Estado alargado, actuando como intermediário entre D. João e Tomás António de Vila Nova Portugal, a propósito de pareceres solicitados sobre a viagem do príncipe herdeiro para o Brasil, entre os quais o pedido ao desembargador José António de Oliveira Leite de Barros. Este é nomeado auditor-geral do Exército e intendente da sua polícia a 6 de Março de 1809, um dia antes de Beresford ser promovido a Marechal do Exército. Leite de Barros é ainda designado inspector-geral das repartições dos Víveres, Transportes e Hospitais. A 10 de Fevereiro de 1814, segundo Ricardo Raimundo Nogueira, sendo o mesmo magistrado “particularmente protegido pelo” 1º visconde de Santarém, quis o Principal Sousa, membro da Regência, agradar a João Diogo de Barros Leitão de Carvalhosa, propondo substituir João António Salter de Mendonça por Leite de Barros enquanto secretário da regência para a Fazenda e Reino - o que não se concretiza (Nogueira 2012, p. 240). A 22 de Maio de 1817, a propósito da descoberta da conspiração Gomes Freire de Andrade, Beresford consulta o 1º visconde de Santarém, Cipriano Ribeiro Freire (presidente da Junta do Comércio) e José António de Oliveira Leite de Barros, desembargador do paço, auditor-geral do Exército e deputado da Casa do Infantado. «Por conseguinte, reuni [é Beresford quem fala] as pessoas com quem podia contar e que são dignas de grande respeito e amigos incontestáveis do rei. Mostrei-lhes os papéis que obtivera e transmiti-lhes tudo aquilo que descobrira e pedi-lhes a sua opinião, perguntando se podia ou devia protelar (…). (…) Foram da opinião unânime de que o governo devia ser informado de tudo o que sabia da operação naquele momento, por muito pouco que eu confiasse nele e ele em mim” (Newit e Robson 2004, pp. 125, e 141-142 e 173, n. e Anónimo (Freitas) 1822, p. 117 e 37 n. 26). O 1º visconde de Santarém, Secretário da Casa e Estado do Infantado, falece a 12 de Janeiro de 1818. A 8 de Setembro de 1820, Leite de Barros é designado Secretário interino da Sereníssima Casa e Estado do Infantado.

“Em 1821 foi deputado do Conselho de Almirantado, da Junta dos Três Estados e da Junta dos Provimentos de Boca” (José Subtil 1996, p. 519). Membro da Junta para o projecto da Carta de Lei Fundamental de 18 de Junho de 1823 (Hespanha 1982, pp. 74 e 88, n. 42). Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça e do Reino (de 19 de Março de 1824 a 15 de Janeiro de 1825, embora interinamente substituído na pasta do Reino pelo conde de Palmela, segundo Figueira 1941, p. 6). Ministro e Secretário de Estado interino da Guerra, após a Abrilada (de 1 a 14 de Maio de 1824). Novamente Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Reino (de 26 de Fevereiro de 1828 a 4 de Agosto de 1833). Ministro e Secretário de Estado interino dos Negócios da Marinha e Ultramar (no mesmo período cronológico), segundo José Subtil 1996, p. 519 e Protásio s.d. [2015], pp. 4 e 10). Foi responsável pelas famigeradas Alçadas do Porto (na sequência da Belfastada, iniciada em Maio de 1828), da Madeira (do mesmo ano) e de outras, no restante território.

Em 1829, quando perfaz setenta anos, para recompensar José António de Oliveira Leite de Barros pelos seus serviços à causa ultrarrealista, D. Miguel (muito influenciado, provavelmente, por D. Carlota Joaquina, que morrerá um ano depois), agracia-o com o título nobiliárquico de 1º conde de Basto e com a grã-cruz da Ordem de Cristo, a 18 de Janeiro de 1829. O novo conde acabara (a 10 de Janeiro) de contrair núpcias com Catarina Lusitana Correia de Morais Leite de Almada e Castro (também designada Almada Machado), filha do 1º visconde de Azenha, militar de linha dura, com quem, deste modo, cimenta uma aliança estratégica. Os viscondes de Azenha tinham, aliás, concedido alvará de licença para que Leite de Barros se casasse com a sua filha, a 9 de Outubro de 1828. Acrescente-se que em Janeiro de 1829 ocorre a chamada revolta do brigadeiro Moreira, da Brigada Real de Marinha, pela qual o brigadeiro graduado Alexandre Manuel Moreira Freire, chefe daquele corpo, se tentara rebelar contra D. Miguel. Esse movimento, ainda mal estudado, é um dos vários momentos do chamado Terror Branco, que muito deve à fúria persecutória do conde de Basto e dos seus sequazes, entre eles o brigadeiro (e marechal-de-campo) Joaquim Teles Jordão e o ministro da Justiça, Luís de Paula Furtado de Castro do Rio de Mendonça.

O conde de Basto morre em Coimbra 4 de Agosto de 1833, dois dias depois de aí chegar, juntamente com a comitiva dos membros do governo de D. Miguel que, na noite de 23 para 24 de Julho, haviam abandonado Lisboa, por decisão do marechal graduado do Exército, duque de Cadaval. Apenas a cólera-mórbus conseguiu vencer a vitalidade deste homem, que simbolizou o que a reacção de ultra-direita mais extremista e que encarnou o que de mais odioso e de intolerante existiu no reino, durante os anos de 1828 a 1834. Foi o conde sepultado na igreja do colégio de São Tomás, amortalhado com o hábito de Cristo (não é referido se com a respectiva grã-cruz). Com a extinção das ordens religiosas, por decreto publicado a 30 de Maio de 1834, a população coimbrã, num gesto de clara repulsa pela figura e feitos do conde de Basto, abre-lhe o túmulo, arrasta-lhe o cadáver pelas ruas e dilacera-o. “Segundo outros o cadáver foi atado a um cavalo que, em corrida desenfreada, foi espalhando e triturando os ossos pelas ruas da cidade-luz!” (Figueira 1941, p. 6).

Porém, nem assim esta figura permanece indiferente à memória nacional, pelos seus actos hediondos e aparentemente incompreensíveis, à luz das modernas ideias de civilização, liberdade, tolerância e progresso humano. As quais, porém, o devir histórico ensina, quotidianamente, que nunca se enraízam completa e simetricamente na comunidade global.

Fontes
ANÓNIMO (FREITAS, Joaquim Ferreira de) [1822] “Memória sobre a Conspiração de 1817, vulgarmente chamada A Conspiração de Gomes Freire de Andrade; escrita e publicada por um Português Amigo da Justiça e da Verdade”, Londres, Ricardo e Artur Taylor, pp. 37, n. 26 e 117.
FIGUEIRA, Joaquim Fernandes (1941), “O conde de Basto. O epitáfio que se desfaz”, Porto, Imprensa Moderna, pp. 5-6.
HESPANHA, António Manuel (1982), “O projecto institucional do tradicionalismo reformista: um projecto de Constituição de Francisco Manuel Trigoso de Aragão Morato (1823)”, in Miriam Halpern Pereira e outros (org.), “O Liberalismo na Península Ibérica na primeira metade do século XIX”, Lisboa, Livraria Sá da Costa Editores, 1982, pp. 74 e 88, n. 42.
LOPES, António (2003), “Gomes Freire de Andrade. O retrato de um homem e da sua época”, Lisboa, Grémio Lusitano, p. 98.
NEWIT, Malyn e ROBSON, Martin (2004), “Lord Beresford e a intervenção britânica em Portugal, 1807-1820”, Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, pp. 125, e 141-142 e 173, n.
NOGUEIRA, Ricardo Raimundo (2012), “Memórias políticas. Memória das coias mais notáveis que se trataram nas conferências do governo (1810-1820). Transcrição, estudo e edição de Ana Cristina Araújo”, Coimbra, Imprensa da Universidade, p. 240.
PROTÁSIO, Daniel Estudante (s.d.; 2015, 2004], “Governo ou governos de D. Miguel? Hipóteses de trabalho e estado da arte” (disponível em https://www.academia.edu/.../Governo_ou_governos_sob_D...), pp. 4 e 10.
PROTÁSIO, Daniel Estudante (2019), “Os algozes de Gomes Freire: análise prosopográfica e ideológica de alguns decisores do seu processo”, «Revista Militar», 2ª Série, 71º vol., n.ºs 2-3 (2605-2606), Fevereiro/Março de 2019, p. 210.
PROTÁSIO, Daniel Estudante (2020), «1º Visconde de Santarém (1757-1818): um estudo biográfico», Lisboa, Chiado Books, pp. 35 (e n. 71), 43, 53 (e n. 153), 66-67 (e ns. 212 e 213) e 74.
SUBTIL, José (1996), «O Desembargo do Paço (1750-1833)», Lisboa, Universidade Autónoma de Lisboa, pp. 506 e 519.
SUBTIL, José (2010), «Dicionário dos Desembargadores (1640-1834)», Lisboa, Ediual, p. 327.

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