Não consigo fugir do Egipto. Quando há levantamentos contra
ditaduras, foge-me o pé para o chinelo. A prepotência democrática,
livremente eleita, já é irritante que chegue. Mas contra o belprazer
republicano, tão dinástico e soberbo que se diria uma imitação macaca da
monarquia absoluta, é difícil não torcer.
Na Tunísia, no Egipto, na Síria, no Iémen, na Coreia do Norte, na
maldosamente monárquica Arábia Saudita e em todos os outros países em
que os que mandam e mamam são sempre os mesmos, é preciso ter um coração
de pedra para não desejar que se lixem todos.
Diz-se que são motins monomaníacos, que apenas querem que o
manda-chuva se vá embora. Que não apresentam uma alternativa de governo.
Fica-se com medo que outros tiranos, livres das corrupções materiais
mas escravos dos mandamentos religiosos, se aproveitem do desgoverno
para darem o golpe.
É uma atitude pouco generosa. Na Tunísia e no Egipto luta-se contra a
injustiça. Não é preciso ter uma alternativa justa – sequer uma
qualquer – para lutar contra a corrupção, que é um sinónimo de
injustiça, sistemática. As revoltas contra a injustiça não são
democráticas nem levam à democracia. São mais antigas e fáceis de
compreender.
Eu até posso não ter nada para dizer, nem grande interesse em ouvir
vários pontos de vista e escolher um deles. Mas repugna-me ouvir apenas
um – e sempre o mesmo – e presumir-se, mesmo que seja verdade, que não
tenho nada a rebater ou acrescentar.
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