
Numa altura em que os laicistas radicais procuram monopolizar o
espaço público, é mais importante que nunca promover o debate livre e
aberto e combater pela liberdade contra a intolerância e fanatismo
Como é sabido, os católicos não tiveram desde a ruptura de
Henrique VIII com a Igreja vida fácil no Reino Unido. Com um longo
historial de (frequentemente despóticas e violentas) perseguições aos
“papistas” a intercalar com períodos de tolerância mais ou menos
incómoda, só a partir do séc. XIX o panorama começou, lenta e
gradualmente, a mudar definitivamente no sentido de uma reintegração
plena.
Uma das melhores ilustrações desta atribulada relação histórica pode
ser encontrada na obra do celebrado John Locke, tantas vezes apontado
como um dos pais fundadores do liberalismo. Ora foi esse mesmo Locke
quem, nos seus escritos sobre a tolerância, achou por bem explicitar
duas excepções à doutrina geral da tolerância que advogava, a saber: os
ateus (por não se poder confiar em quem não reconhece Deus) e os
católicos (por obedecerem a um soberano externo).
Felizmente para os britânicos e para o mundo, o Reino Unido conseguiu
evoluir bastante para além do sectarismo do tempo de Locke e hoje a
situação é diferente. Mas se a perseguição especificamente dirigida
contra católicos é hoje muito mais rara no Reino Unido, novas ameaças
contra a liberdade emergiram, com destaque para a agenda laicista
radical e anti-cristã que contamina o discurso público em muito do mundo
ocidental.
É neste contexto que merece ser saudada a criação do Benedict XVI
Centre for Religion and Society na St Mary’s University, em Londres. O
Centro (do qual, a título de declaração de interesses, devo informar que
sou membro)
recolhe inspiração no profundo legado intelectual de Bento XVI – e
muito em especial na sua vigorosa insistência na necessidade de
compreender a complementaridade entre fé e razão.
Simbolicamente, a Universidade aprovou a criação do Centro em 2015,
no quinto aniversário da visita do hoje Papa Emérito Bento XVI ao Reino
Unido e à própria St. Mary’s University. A aprovação oficial da Santa Sé
para nomear o Centro em honra de Bento XVI foi concedida no início de
2016, preenchendo assim todas as condições para o lançamento oficial que
decorreu no passado dia 5 de Maio.
O Centro visa ser uma referência internacional para a investigação
nas áreas da religião e das ciências sociais (em especial economia,
sociologia e ciência política) e baseia-se na convicção fundamental –
tão enfatizada por João Paulo II (Ex Corde Ecclesiae, 46) – de que a
promoção da investigação interdisciplinar que interligue as várias áreas
científicas modernas com a teologia e a ética é um aspecto crucial da
missão de uma Universidade Católica.
Para o cumprimento dos seus ambiciosos objectivos, para além do
imprescindível rigor académico e científico, o Centro terá uma
preocupação especial com actividades de divulgação do conhecimento,
envolvimento com a comunidade e intervenção nos mais relevantes debates
no domínio das políticas públicas. Objectivos que requerem também uma
abertura pluralista a diferentes visões e uma atitude flexível, aberta
ao diálogo e inclusiva – como tem sido apanágio do Papa Francisco – sem
comprometer princípios essenciais.
Como referiu na cerimónia de lançamento Ruth Kelly, ex-ministra
trabalhista e também membro do Benedict XVI Centre for Religion and
Society, é fundamental que o Centro tenha um papel activo na vida
pública. Numa altura em que os laicistas radicais procuram monopolizar o
espaço público, é mais importante que nunca promover o debate livre e
aberto e combater pela liberdade contra a intolerância e fanatismo.
Para os portugueses interessados em conhecer melhor o Centro e os
seus protagonistas, a visita de Philip Booth a Lisboa constituirá uma
boa oportunidade para o efeito, nomeadamente através da aula aberta –
sobre a crise financeira global e respectivas causas – que leccionará no próximo dia 25 de Maio, no Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa.
Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade
Católica Portuguesa, membro do Benedict XVI Centre for Religion and
Society e Visiting Senior Fellow da St. Mary’s University.
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