Francisco Rolão Preto, líder do Nacional-Sindicalismo no início da década de 1930,
queria que “os muito ricos ficassem menos ricos para os muito pobres ficarem menos pobres”
ARQUIVO ANTÓNIO COSTA PINTO / EDIÇÕES 70
Parece confuso mas aconteceu. Francisco Rolão Preto, fascista, monárquico, tentou derrubar Salazar por ser um “homem de centro e um formalista universitário”. Foi preso, viveu no exílio, apoiou Humberto Delgado e, depois do 25 de Abril, aderiu ao Partido Popular Monárquico. Breve retrato do homem que queria que “os ricos fossem menos ricos para os pobres serem menos pobres”
Quatro anos mais novo do que Salazar, Francisco Rolão Preto, o ultra-fascista que liderou o movimento nacional-sindicalista em Portugal, morreu nove anos depois do ditador ter caído da cadeira e três anos depois do 25 de Abril de 1974. Homem de fortes convicções, liderou a extrema-direita que se opôs à governação do professor de Coimbra na década de 1930 e, posteriormente, depois de ter estado preso e viver no exílio, aliou-se à oposição democrática para derrubar o ditador.
Anti-Salazarista convicto, acreditava no fascismo revolucionário e apostou no movimento
sindical para conquistar as massas operárias. A PVDE, polícia política
que antecedeu a PIDE, chegou a apelidá-lo de “comunista branco”. O
termo, é uma metáfora da expressão “russos brancos”, muito em voga na
primeira metade do século para designar os russos que se tinham oposto à
revolução bolchevique de 1917, que acabou com a Rússia dos czares para
fundar a já desaparecida União Soviética.
Para
a PVDE, antecessora da PIDE, “o nacional-sindicalismo é a primeira
tentativa de penetração da extrema direita na classe operária”, diz ao Expresso o historiador António Costa Pinto, autor do livro ““Os Camisas Azuis e Salazar - Rolão Preto e o Fascismo em Portugal”.
Salazar
chegou a temer esta personagem pouco conhecida de muitos portugueses,
que quis conquistar as massas operárias para a causa fascista, apostando
no movimento sindical e defendendo a comemoração do 1.º de Maio, Dia
dos Trabalhadores.
Oito décadas depois, muitos estranharão as
divergências doutrinárias que existiam entre dois defensores de um
regime autoritário e repressivo de direita. Mas a verdade, é que houve
especificidades ideológicas que caracterizaram os diferentes fascismos na
primeira metade do século XX.
O ideário de Rolão Preto
inspirava-se no fascismo italiano, “movimento revolucionário associado
ao modernismo”. Esta ideologia, colidiu com o modelo de Salazar, oriundo
do “movimento católico, e que desconfia dos movimentos fascistas” - por
apostarem na galvanização das massas - da sua iconografia, “das
milícias”, e da mobilização da classe operária, explica Costa Pinto.
A
repartição da riqueza que Rolão Preto defendia em ideário, tinha por objecto conquistar a massas operárias e os sindicatos para o
nacional-sindicalismo de que foi líder; este movimento nacionalista tem a
sua génese no Integralismo Lusitano de António Sardinha. Desenvolveu-se
na década de 1930 por oposição ao movimento internacionalista
proletário dos comunistas.
“Em Março de 1934, já em luta aberta
com Salazar, Rolão Preto referia-se com orgulho ao aparecimento de uma
nova ‘elite’ operária” associada ao nacional-sindicalismo: “Dêem-se
possibilidades aos humildes, aos filhos do povo que logo de tenra idade
amassam com o suor do seu rosto o pão que comem”, escreveu o líder do
nacional-sindicalismo numa obra citada por Costa Pinto.
O pavor dos comunistas
O
partido Comunista Português foi fundado em 1921, quatro depois da
Revolução Russa de 1917. Tal como Salazar, Rolão Preto “temia a
‘nefasta’ influência comunista” junto das massas trabalhadoras.
Capa do livro “Camisas Azuis e Salazar - Rolão Preto e o Fascismo em Portugal”
DR
O nacional-sindicalismo tinha uma “boa base organizativa. Várias sedes a funcionar, uma rede de cerca de dezena e meia de inscritos de órgãos regionais e locais, e alguns milhares de inscritos”. Mas, ao contrário de outras organizações - como a União Nacional [o partido único do Salazarismo] - o movimento liderado por Rolão Preto “estruturava-se sem ambiguidades em moldes fascistas, sob o ponto de vista organizativo, ideológico e de acção política”.
Numa
carta confidencial enviada a Salazar, Marcelo Caetano, que tinha menos
13 anos do que Rolão Preto, e que com ele partilhava uma ligação de
juventude ao Integralismo Lusitano, escreveu: É o “primeiro movimento
espontâneo de opinião que surge desde que há Ditadura; um movimento que
não foi dolorosamente posto em marcha pelo ministro do Interior, que não
é obra dos governadores civis, que não se sustenta à custa dos favores
do governo, que não é agência eleitoral”.
O jornal “Revolução”, órgão do movimento nacional-sindicalista, tinha um suplemento destacável que era distribuído gratuitamente
ARQUIVO ANTÓNIO COSTA PINTO / EDIÇÕES 70
Apesar
de haver apoiantes do Estado Novo que alimentaram um certo fascínio
pela mobilização de massas que Rolão Preto defendia, a partir de maio de
1933, “os conflitos violentos começaram a generalizar-se na rua, cada
vez que os nacional-sindicalistas se manifestavam”.
Em Junho de
1933, Alberto de Monsaraz, companheiro de Rolão Preto, anunciou a
intenção de organizar uma manifestação comemorativa da batalha de
Aljubarrota, com a participação de 10 mil homens envergando o fardamento
com camisas azuis. O ministério do Interior “não autorizou o desfile”.
A
10 de Setembro de 1935 Rolão Preto e os seus companheiros falharam um
golpe contra Salazar. Mendes Norton e Manuel Valente foram presos, Preto
partiu para o exílio em Espanha.
Com o passar do tempo, alguns
dos seus companheiros capitularam na pulsão revolucionária, e acabaram
por aderir ao Estado Novo de Oliveira Salazar; foi o caso de Gonçalves
Rapazote que foi deputado da Assembleia Nacional e ministro do Interior.
Mas, Rolão, manteve-se monárquico e anti-Salazarista convicto até ao
fim da vida. Em 1945, estabeleceu a sua primeira aliança com a oposição
democrática. Em 1958, apoiou a candidatura do general Humberto Delgado à
Presidência.
É desta personagem e do mais organizado movimento
fascista que contestou Salazar pela sua direita, que nos fala o livro
“Os Camisas Azuis e Salazar - Rolão Preto e o Fascismo em Portugal”. A
obra que vai ser apresentada esta quinta-feira em Lisboa, na Livraria
Almedina, por Fernando Rosas e Pedro Tavares de Almeida, é uma reedição
revista e actualizada da tese de doutoramento de Costa Pinto, publicada
em 1994.
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