Há umas semanas, aqui dizíamos que esta
intervenção estrangeira, significa algo de muito mais pesado e
humilhante que a poeira levantada pelo Ultimatum de 1890. Há
121 anos, nada de material perdemos, pois toda a controvérsia provinha
de sonhos e de velhas alegorias de uma sempre procurada grandeza. O que o
Ultimatum, o que a Monarquia nos deixou, foi um património
ultramarino inesperadamente vasto e rico e que ainda representa uma das
razões de ser de um Portugal independente, numa Comunidade Lusófona de países independentes.
Chegaram de fora os três Regentes
e em pouco mais de duas semanas, impõem a execução de um programa que
paradoxalmente, não pôde deixar de recorrer ás preciosas fontes de
informação e estatística que são fruto do laborioso trabalho de
portugueses. Esta fonte de informações há muito existe e tem sido sempre
ostensivamente ignorada. A conclusão que retiramos do dislate, é a
evidência da total incapacidade e inépcia do sistema instalado,
tornado refém de si próprio e sem força ou vontade para implementar as
medidas necessárias à sua própria sobrevivência. Mesmo aqueles que mais
situacionistas são, há muito sabem desta necessidade reformadora que
atinge todo o edifício estatal e que a ser realizada com sucesso, terá
imediatos reflexos na sociedade.
No verão passado, os avaros detentores
das auto-outorgadas mordomias levantaram todo o tipo de obstáculos,
procurando aterrorizar o país com essa inexorável chegada dos Regentes,
apresentando-a como uma absurda reedição de cavaleiros do apocalipse.
Todos sabíamos que viriam, mas apenas permanecia uma indefinição quanto à
data. Naquele preciso momento, Paulo Teixeira Pinto abriu o necessário
capítulo da revisão constitucional e então, todo o tipo de argumentos
foram utilizados para liquidar o estudo. Os bem instalados sátrapas,
gostam e querem a Constituição que ruma a um socialismo que nem os
reivindicadores da superstição - quatro partidos parlamentares - sabem
definir de forma uníssona. Por muito estranho que possa parecer, aquilo
que mais se aproxima dos sonhos do sector "socialista democrático",
consiste precisamente em modelos, cujos ordenamentos constitucionais não
estabelecem quaisquer etéreos rumos, ou jamais mencionam a sacrossanta
palavra. Pior ainda, são todos eles Monarquias cuja base de apoio
popular é esmagadora e tão mais surpreendente, quando comparada com o
parco respeito que a República Portuguesa colhe entre os seus súbditos.
Paulo Teixeira Pinto apresentou um rascunho de proposta para uma revisão constitucional. O PSD
não teve nem a força, nem a lealdade interna - coisa rara na sede
laranja - para assumir o que todos sabemos ser um imperativo urgente.
Amedrontado pela engrenagem propagandística que assola o país, o PSD
recuou, humilhou-se e viu passar a oportunidade. Não nos surpreenderá se
a bandeira for dentro de pouco tempo reerguida pelo seu eterno rival
ainda no poder, apresentando-a à população como um "exemplo de coragem e
de patriotismo". Aliás, está no seu pleno direito. É assim que a
política funciona em Portugal.
Não existiu qualquer "acordo", esta é a
verdade com que nos regozijamos, intimamente vingados pela humilhação
que não foi imposta à população, mas aos agentes políticos. Diante dos
olhos de dez milhões de portugueses, três homens que chegaram de longe,
passaram um atestado de incompetência aos "dirigentes portugueses",
sejam eles os que estão à frente dos partidos do chamado arco
governamental, ou aqueles outros que envoltos em velhos e esburacados
xailes vermelhos de outro século, remetem-se à solidão nas suas cavernas
de eremitas.
Paulo Teixeira Pinto tinha razão, quando
generosamente pretendeu salvar alguma coisa daquilo que existe naquele
amontoado de páginas que têm estampado um articulado já sem nexo. Hoje, o
coordenador da revisão constitucional foi ultrapassado pelos
acontecimentos e uma revisão já não serve. Num programa de debate
político e perante um Carlos Abreu Amorim bastante embaraçado,
Joana Amaral Dias abespinhava-se com a possibilidade de Pedro Passos Coelho, o líder do maior partido da oposição, poder ser simpatizante da Monarquia, como se isso fosse um bom motivo para o reerguer de forcas ou rápida preparação de um auto-da-fé. Ontem, Jorge Sampaio saltou à boleia do conhecido comboio monárquico e agora insiste na necessidade de uma simplficação do mapa autárquico, um projecto que Ribeiro Telles há quarenta anos apresenta como uma inevitabilidade. Bem pode Sampaio dizer o que bem entender e atirar pazadas de carvão na fornalha, pois sabe que no actual quadro de caciquismo a que o país está entregue, a simplificação do mapa autárquico seria uma declaração de guerra que varreria o regime de norte a sul. Uma ou outra voz clama pela necessidade da adopção de uma nova forma de escrutínio da vontade popular. Subindo mais alto na hierarquia e pelas palavras de um dos Regentes, Portugal ficou ciente da inutilidade da assinatura presidencial no pretenso "acordo" que mais propriamente pode ser considerado como um esperado Diktat. Para os senhores da Comissão Europeia, do FMI e do BCE, o Parlamento é soberano e o Presidente do regime - eleito por uma insignificante soma de votos desgarrados -, consiste um mero apêndice descartável e sem qualquer interesse.
Joana Amaral Dias abespinhava-se com a possibilidade de Pedro Passos Coelho, o líder do maior partido da oposição, poder ser simpatizante da Monarquia, como se isso fosse um bom motivo para o reerguer de forcas ou rápida preparação de um auto-da-fé. Ontem, Jorge Sampaio saltou à boleia do conhecido comboio monárquico e agora insiste na necessidade de uma simplficação do mapa autárquico, um projecto que Ribeiro Telles há quarenta anos apresenta como uma inevitabilidade. Bem pode Sampaio dizer o que bem entender e atirar pazadas de carvão na fornalha, pois sabe que no actual quadro de caciquismo a que o país está entregue, a simplificação do mapa autárquico seria uma declaração de guerra que varreria o regime de norte a sul. Uma ou outra voz clama pela necessidade da adopção de uma nova forma de escrutínio da vontade popular. Subindo mais alto na hierarquia e pelas palavras de um dos Regentes, Portugal ficou ciente da inutilidade da assinatura presidencial no pretenso "acordo" que mais propriamente pode ser considerado como um esperado Diktat. Para os senhores da Comissão Europeia, do FMI e do BCE, o Parlamento é soberano e o Presidente do regime - eleito por uma insignificante soma de votos desgarrados -, consiste um mero apêndice descartável e sem qualquer interesse.
Temos as directivas financeiras e
económicas que implicam uma profunda revisão da estrutura do edifício do
Poder. Pessimistas, não acreditamos que os actuais homens do regime,
hábeis ilusionistas mas péssimos estadistas, sejam capazes de executar
aquilo que o país espera e intimamente quer.
Como conclusão, esta República está hoje tão morta como as suas duas antecessoras.
publicado por Nuno Castelo-Branco em "Estado Sentido"
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