Em defesa do regímen da Monarquia Constitucional Parlamentar importa
apontar um benefício tão evidente quanto fundamental: o Monarca é a
ressalva capital contra determinações políticas autoritárias.
Um Rei conserva e eleva a democracia e suprime qualquer tentativa
negativa de poder. Não raras vezes, lembrou o Imperador Austro-Húngaro
Francisco José I, ‘a função do Monarca é defender o Povo dos maus políticos.’ Deposto o Imperador que se seguiu?! Sir Winston Churchill respondeu de forma assertiva: ‘Se
os Aliados no Tratado de Versalhes tivessem permitido que um
Hohenzollern na Alemanha, um Habsburgo no Império Austro-Húngaro e um
Wittlesbach na Baviera retornassem aos seus tronos, não haveria um
Hitler. A base democrática da sociedade teria sido preservada por uma
Weimer coroada em contacto com os Aliados vitoriosos’. De facto,
com um Rei na Prússia – poderoso oriente alemão – que continuou Estado
Livre até 1933, esta nunca seria transformada em distrito e com a
poderosa Baviera Coroada o sul alemão nunca seria submetida ao capricho
ditatorial; se mesmo assim, se desse a Unificação germânica, com a
Monarquia Dual do Império Austro-Húngaro, nunca se verificaria o anchluss que assegurou a Adolf Hitler o sul da fronteira alemã, e, com a Áustria fora da equação bélica não haveria Führer
porque não haveria III Império, e, como tal, não se lançaria
poderosamente na terrível Guerra. Sim, a experiência confirmou o valor
da Monarquia como uma fonte de travões e uma matriz de contrapesos
contra políticos eleitos que poderiam procurar obter poderes maiores aos
atribuídos pela Constituição e, assim, em último caso, como uma
ressalva contra a ditadura.
De facto, uma coisa só é superada quando se actua de modo a que tal
coisa forme com o seu contrário uma unidade: é a tese e a antítese
hegeliana. Para haver uma anulação de uma força negativa política tem
que haver uma força positiva capaz de a contrabalançar. Num regime
político só um Rei tem essa energia e consegue de forma perfeita
acentuar essa determinação positiva evitando a ascensão de tiranos.
Tal não acontece com outro Chefe de Estado que não seja um Monarca,
uma vez que há a grande vantagem do Rei enquanto entidade real
independente, não eleito, não representar qualquer partido político e
seus sectários e com tal não segurar nenhuma agenda política, podendo
assim com o seu Poder Moderador proteger a estabilidade dentro da
multiplicidade politico-social do país, inibindo desta forma a
perturbação política e, previsivelmente, a efervescência social. Acima
de tramas partidárias, independente de um calendário político, de
promessas eleitorais, sem relações suspeitas com oligarquias, sem
solidariedade activa com políticos – pois não são seus pares -, sem
diligências a favor de clientelas eleitorais e financiadores de
campanhas que esperam obter benefícios e dividendos do seu
‘investimento’, o Rei terá a tranquilidade e a legitimidade para actuar
como moderador entre as várias facções políticas ou demais grupos da
sociedade civil e interpor-se perante os governos como cautela da
democracia.
Perante este exemplo moral e suprapartidário todos os políticos são
pálidos ‘adversários’ de comparação com uma Figura como a Real. Um
Monarca não se reduzirá jamais a um desajeitado padrinho de uma
legislatura, em que há medida que o tempo do mandato passa a sua posição
se torna cada vez mais vulnerável e ineficaz, nem estará sujeito a
pressões, tendo a energia para contrapeso e moral para evitar críticas
agrestes, para granjear admiração e distinguir-se pela lição rigorosa e
edificante. O Rei será um marinheiro experiente que exerce como tal
quando a ocasião requer: o Homem do Leme!
Atente-se ao caso da Monarquia Britânica.
O Parlamento britânico é composto por três entidades: o Soberano, a Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns.
É prerrogativa do Monarca convocar, suspender a sessão e dissolver o
Parlamento. Cada sessão parlamentar começa com a convocação do Soberano.
Assim ao ocupar o mais alto cargo da Nação, o Monarca evita que
qualquer tirano arrepanhe o governo. O sistema parlamentar de governo é
de interdependência por integração, pois Governo e Parlamento estão indissoluvelmente unidos, não podendo exercer as suas funções sem harmonia recíproca.
Uma Proposta do legislador no Parlamento é apresentada na Câmara dos
comuns, depois debatida na comissão parlamentar, que depois a remete
novamente à Câmara que a envia para a Câmara dos Lordes, que a debate em
comissão, a recebe a aprova e envia à Rainha que dá o seu Assentimento
Real e todas as leis são aprovadas em nome do Monarca. As palavras “SEJA
PROMULGADO pela mais excelente Majestade da Rainha (ou Rei), por e com o
conselho e consentimento dos Lordes Espirituais e Temporais, e Comuns,
presentes neste Parlamento reunido, e pela autoridade do mesmo, como se
segue“, conhecido como cláusula de promulgação, fazem parte de cada uma das leis do Parlamento. O Soberano pode, em teoria, “conceder” o Consentimento Real (fazer o projecto de lei tornar-se lei) ou “recusar” o Consentimento Real (vetar o projecto de lei). Na prática, o Assentimento Real serve de travão impedindo leis injustas.
Ora é essa prerrogativa real o maior garante da democracia plena, ou
seja méritocracia, pois no que diz respeito aos assuntos internos é
ampla. A Coroa é responsável pela nomeação e demissão dos ministros,
conselheiros privados, membros de várias agências executivas e de outros
funcionários. Dessa forma pode ser evitado o acesso a cargos públicos
de pessoas sem escrúpulos, criminosos – ainda que sirvam de exemplo para
alguns políticos, nunca o servirão para um Monarca.
Além disso, o monarca é o comandante-em-chefe das Forças Armadas – é
prerrogativa do soberano declarar guerra, fazer a paz e orientar as
acções dos militares – pelo que nenhum ditador pode tomar para si o
controlo do exército e usá-lo em proveito próprio.
A prerrogativa real estende-se a assuntos externos. O soberano pode
negociar e ratificar tratados, alianças e acordos internacionais; não é
necessária uma aprovação parlamentar. Um tratado assim não pode alterar a
legislação nacional.
O Soberano é considerado a fonte de justiça, e é responsável
pela prestação de justiça a todos os súbditos e as funções judiciais
são desempenhadas em Seu nome. Por exemplo, os processos penais são
julgados em nome do Soberano, e os tribunais derivam sua autoridade da
Coroa. O direito comum sustenta que o soberano “não pode fazer mal” e
assim nenhum político pode instrumentalizar os tribunais para seu
proveito e conduzir o julgador a aplicar as leis por encomenda.
A Prerrogativa real é a autoridade executiva do governo e investida
no Soberano e como a monarquia é constitucional, o monarca actua dentro
dos limites da convenção e precedentes (Constituição), exercendo a
prerrogativa real com os conselhos dos ministros. A aprovação
parlamentar não é exigida para o exercício da prerrogativa real; o
consentimento da Coroa deve ser obtido antes mesmo que a Câmara possa
debater um Projecto de Lei que atinja as prerrogativas ou interesses do
Soberano. Embora a prerrogativa real seja ampla, ela não é ilimitada,
mas é a chave e garante da democracia.
Assim o principal poder do Monarca é negar poder a quem dele pudesse abusar!
Diga-se mais, é na Monarquia que a Democracia se realiza mais intensa
e profundamente. De resto, sete dos dez Países com maior índice de
democracia são Monarquias Constitucionais, com a Noruega em 1.º lugar,
seguida da Suécia em 2.º, a Nova Zelândia em 4.º e da Dinamarca em 5.º –
só para citar alguns exemplos.
No caso concreto português, o artigo 71.º da Carta Constitucional de 1826 estatuía: “O
Poder Moderador é a chave de toda a organização política e compete
privativamente ao Rei, como Chefe supremo da Nação, para que
incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e
harmonia dos mais Poderes Políticos”. É o mérito de completar, que nenhum político pode jamais arrojar-se de possuir.
Ora vivem-se tempos em que a política interna é caracterizada pela
deliquescência e desagregação do sistema do rotativismo partidocrata, o
que em último grau comprova a dissolução do regímen republicano
desprestigiado e enfraquecido por incompetência e impreparação técnica e
política, escândalos de corrupção, nepotismo, favorecimento,
privilégio, despesismo, sem que se assumam as responsabilidades pelos
próprios erros. Perante estas rupturas sem perdão, perante antinomias
inconciliáveis, urge o homem do rigor, do desatar e não da contractura,
que abra os debates e os feche quando a situação o exigir, que
instantaneamente suspenda as atitudes hostis que periguem a Nação e a
Comunidade.
É necessário que o actual regímen reconheça a sua ligeireza, os seus
limites e passe o testemunho; faça-se uma síntese da Monarquia
Portuguesa que durou oito séculos e compare-se a riqueza de antanho com o
presente reduzido e deixe-se que projecte sobre este breu republicano a
claridade sem par da Monarquia. É necessário firmar o ceptro português
sobre os escombros de um regímen esclerosado, exaurido e a exalar os
últimos suspiros sobre os braços da anarquia que se tornou. É preciso
salvar a Nação!
Basta de um regime de Imperium paternale, que vê os cidadãos
como crianças menores que não podem discernir o que lhes é realmente
vantajoso ou nocivo, submetendo-os a comportar-se de modo paciente,
aguardando da classe dirigente um alvitre sobre a melhor maneira de que
devem ser felizes, e no grau que essa classe o queira.
Somente uma lógica como a revolucionária dos golpistas do 5 de
Outubro de 1910 podia achar argumentos contra a clareza deste
raciocínio, pois apropriaram-se dos meios de coacção e alçaram-se no
poder e nas benesses, enquanto a jovial mentira fazia as delícias de um
século…
Miguel Villas-Boas – Plataforma de Cidadania Monárquica
Artigo publicado originalmente na Real Gazeta do Alto Minho n.º 4, boletim da Real Associação de Viana do Castelo, em: http://issuu.com/joseanibalmarinhogomes/docs/realgazetaaltominho_4/1
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