Por ocasião da beatificação do Venerável Carlos de
Habsburgo (1887-1922), na Basílica de São Pedro, em Roma, a 3 de
Outubro de 2004, os Arautos d'El-Rei quiseram assinalar essa data
prestando homenagem à memória do último Monarca do Império
Austro-Húngaro, dando a conhecer alguns traços essenciais da existência e
da personalidade desse extraordinário Homem e grande monarca, falecido
na Ilha da Madeira a 1 de Abril de 1922, exilado e com apenas 34 anos de
idade.
O seu exemplo de vida, a integridade de
carácter, o amor ao próximo e a fidelidade aos princípios imutáveis da
Igreja Católica e ao Papado devem constituir um modelo e ponto de
referência para todos os Chefes de Estado -- sejam eles Chefes de Estado
Reais ou não -- e também para todos os chefes de família, militares,
políticos e para a sociedade em geral, uma vez que o legado que o
Imperador Carlos de Habsburgo nos deixou tem um alcance universal,
projectando-se muito para além das fronteiras geográficas e políticas
das regiões que outrora constituíram o Império Austro-Húngaro e dos seus
povos.
Carlos Francisco José de
Habsburgo, Arquiduque e Príncipe Imperial da Áustria, Príncipe Real da
Hungria e da Boémia, Príncipe Ducal de Lorena e de Bar, Príncipe de
Habsburgo-Lorena, nasceu no pequeno Castelo de Persenberg. Era o filho
mais velho do Arquiduque Otão (*1865 †1906) e da Arquiduquesa Maria
Josefa (*1867 †1944), nascida Princesa Real de Saxe. Desde muito
jovem foi evidente a sua propensão para as coisas de Deus, faceta que se
perpetuou ao longo de toda a vida, quer durante os anos da sua carreira
militar quer posteriormente já como Imperador da Áustria e Rei da
Hungria e como pai e chefe de família. Carlos de Habsburgo praticou
exemplarmente os seus deveres de cristão, tanto em público como na
esfera privada, procurando sempre o bem do próximo e fazendo tudo para
aliviar o sofrimento dos mais necessitados. Era frequente encontrá-lo a
rezar recolhido no seu gabinete de trabalho e também na frente de
batalha. Encorajava os seus soldados a rezar e, antes de dar início a
uma reunião ou a qualquer outro acto formal ou informal era frequente
pedir a quem estivesse consigo que o acompanhasse numa breve oração.
A
21 de Outubro de 1911, casou com a sua prima a Arquiduquesa Zita de
Bourbon (*1892 †1989), Princesa de Parma, Princesa de Bourbon-Anjou,
quarta filha do Duque de Parma, D. Roberto I (*1848 †1907) e da sua
segunda mulher, a Infanta D. Maria Antónia de Bragança (*1862 †1959) --
esta última, filha do Rei D. Miguel de Portugal. A
união conjugal de Carlos de Habsburgo com Zita de Bourbon foi abençoada
pelo Papa São Pio X que "em audiência privada a Zita preconizou o futuro
do seu consorte como imperador e revelou-lhe que as virtudes cristãs de
Carlos seriam um exemplo para todos os povos".
Em
1903 o Arquiduque Carlos iniciava a sua carreira militar a qual iria
terminar em 1916 já em plena I Guerra Mundial, ano em que subiu ao trono
da Áustria com o nome de Carlos I, após a morte do seu tio-avô o
Imperador Francisco José. Tornou-se príncipe herdeiro em consequência do
assassinato do seu tio e herdeiro do trono, o Arquiduque Francisco
Ferdinando, às mãos de nacionalistas sérvios, em Sarajevo, na capital da
província da Bósnia-Herzegovina, facto que iria despoletar a Primeira
Grande Guerra.
No seu curto reinado,
como Imperador da Áustria e Rei da Hungria, Carlos de Habsburgo procurou
incessantemente uma solução para a paz entre todos os beligerantes e
mostrou uma preocupação contínua pelo bem-estar espiritual e material
dos seus povos, revelando, neste aspecto particular, estar bem à frente
dos Chefes de Estado seus contemporâneos. Durante largos períodos, no
decorrer da Primeira Grande Guerra, Carlos de Habsburgo ordenou o
racionamento de víveres no palácio Real, à semelhança do que acontecia
em toda a cidade de Viena. Ordenou também que se utilizassem os cavalos
do palácio para a distribuição de carvão por toda a capital do Império,
tendo igualmente lutado contra a usura e a corrupção que grassavam
naquela época. Todas as suas decisões, como monarca, eram
tomadas, invariavelmente, em função de valores éticos e morais, pondo
sempre em primeiro lugar o princípio cristão do bem do próximo por amor a
Deus. Essa sua forma de sentir e de agir levou-o a proibir
bombardeamentos estratégicos de populações e de edifícios civis e a
restringir a utilização do gás mostarda. Também fez aprovar leis que
impediam a leitura de publicações obscenas nas fileiras do exército e
deu início a um movimento destinado a distribuir aos militares que se
encontravam na frente de batalha publicações com conteúdos edificantes,
tendo estimulado e implementado a formação de uma imprensa de orientação
católica. Essa sua conduta exemplar tornou-se bem patente também
nos momentos mais difíceis da sua vida. Com efeito, após ter sido
obrigado a renunciar ao trono imperial e durante a sua reclusão em
Eckartsau, foi contactado várias vezes por pessoas e grupos sem
escrúpulos que lhe sugeriam que voltasse a ocupar o trono perdido,
havendo nas propostas desses grupos motivações e interesses em nada
coincidentes com a forma de sentir e de agir de Carlos de Habsburgo.
Perante o conteúdo de de tais propostas recusou-as afirmando: "Como
monarca católico, nunca farei um acordo com o mal, mesmo para recuperar o
meu trono."
Por ocasião da última
tentativa de restauração do trono imperial, com o apoio do governo
Francês e do Vaticano, o Imperador-Rei foi feito prisioneiro e enviado
para o exílio na Ilha da Madeira, onde acabaria por morrer pouco tempo
depois vítima de doença súbita. Ao aperceber-se que o seu estado de
saúde se ia agravando e que já estava próximo o fim da sua existência
terrena, e muito brevemente estaria na presença de Deus, Carlos de
Habsburgo mandou chamar o seu filho mais velho, o Príncipe Otão, para
que se aproximasse do seu leito de morte. Com essa atitude queria Carlos
de Habsburgo que o seu filho testemunhasse a fé com que ele se
aproximava da morte, tendo afirmado: "Quero que ele veja como morre um
Católico e um Imperador."
Coerência e
integridade, palavras que caracterizam de modo perfeito a maneira de
pensar, de sentir e de agir do Imperador Carlos de Habsburgo, traços
marcantes da sua personalidade como Monarca, como Chefe de Família e
como católico. Coerência e integridade do Monarca Carlos de
Habsburgo perante os ensinamentos da Igreja Católica, aspectos que
estiveram sempre presentes nas suas decisões políticas e nas leis que
promulgou e que reflectem realidades diametralmente opostas à atitude
tão em voga nos nossos dias, em que muitos políticos e governantes para
manterem o seu prestígio pessoal e os seus cargos votam, se necessário,
contra os ensinamentos da Igreja e contra a sua própria consciência.
Coerência e integridade, palavras que, infelizmente, vão fazendo cada
vez menos sentido em largos sectores das sociedades ocidentais, onde os
princípios morais e éticos são paulatina e quase que imperceptivelmente
relegados para segundo plano e substituídos por um espírito de
tolerância relativista, em larga medida sustentado pelos grandes média,
frequentemente alinhados com sectores ideológicos que pretendem fomentar
uma revolução nas mentalidades e nas formas de agir e de sentir dos
povos da Europa Cristã, visando em última análise a transformação
gradual e radical dos seus hábitos mentais, dos seus costumes e
tradições e a cedência a novas formas de pensar, de sentir e de agir em
tudo contrárias aos ensinamentos da Igreja e às de uma autêntica
Civilização Cristã.
José Filipe Sepúlveda da Fonseca
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