Já há muito que deixei de assistir a conferências pois, entre nós, aquilo a que se dá o nome de conferência é um penoso, interminável e cansativo exercício de leitura - amiúde monótona, monocórdica e enfatuada - de uma resma de papel perante um público semi-adormecido e cabeceante. Desculpam-se os nossos leitores de papéis que a língua portuguesa não oferece campo para grandes rasgos oratórios. Desculpam-se estes coveiros da comunicação que o discurso vale pelo conteúdo e não pela forma, presumindo que um discurso deve reproduzir um compêndio de erudição pelo qual o [falso] orador exibe conhecimentos. Não, o problema não está na língua, mas nos leitores de papéis, no seu acanhamento, insegurança e falta de inspiração.
Os espanhóis, os italianos, os franceses e os nossos irmãos brasileiros são mostra sobeja daquela eloquência corporal que faz das línguas latinas esplêndido campo para a boa teatralização do discurso. Como lembrava Manuel Teixeira Gomes, "nós, latinos, precisamos de acompanhar o movimento do cérebro com o movimento das mãos, que sublinha e ampara o pensamento". Ao negá-lo, reduzindo o discurso a uma sensaborona leitura, privamos a língua da chama e da paixão racional que lhe dá vibração. A boa oratória não é prolixidade. A boa oratória é verbo e movimento, incandescência que conquista inteligências e corações, retira dos túmulos gelados sentimentos represados, desperta a fantasia, casa o vernáculo com a espontaneidade e demonstra que é na língua que reside a cultura de um povo.
Parece que em Portugal essa prodigiosa capacidade se apagou com o fim da Companhia de Jesus e das ordens religiosas vocacionadas para a predicação, as quais conheciam o valor da comunicação e da aventura do discurso sem papéis. Desses séculos de vivência com a língua como arma feita de paixão, persuasão e conquista ficou pouco, muito pouco. Desde então, umas figuras pálidas, imóveis, recolhidas e escravas de papéis passaram a desencantar a língua, secando-a e enfatuando-a. Há, pois, que restaurar nos oradores portugueses essa espontaneidade esquecida, ensinar-lhes a arte da encantação, pois o verbo faz maravilhas. Perante o discurso que [se] mata, há que reencontrar o discurso que humaniza, arranca aplausos, desperta sentimentos, materializa a adesão ou a aversão. No fundo, trata-se de ensinar às nossas crianças a arte de se transcenderem e encontrarem a chama que está represada nos corações. A língua portuguesa precisa, urgentemente, de se libertar dos seus carcereiros.
MCB
Os espanhóis, os italianos, os franceses e os nossos irmãos brasileiros são mostra sobeja daquela eloquência corporal que faz das línguas latinas esplêndido campo para a boa teatralização do discurso. Como lembrava Manuel Teixeira Gomes, "nós, latinos, precisamos de acompanhar o movimento do cérebro com o movimento das mãos, que sublinha e ampara o pensamento". Ao negá-lo, reduzindo o discurso a uma sensaborona leitura, privamos a língua da chama e da paixão racional que lhe dá vibração. A boa oratória não é prolixidade. A boa oratória é verbo e movimento, incandescência que conquista inteligências e corações, retira dos túmulos gelados sentimentos represados, desperta a fantasia, casa o vernáculo com a espontaneidade e demonstra que é na língua que reside a cultura de um povo.
Parece que em Portugal essa prodigiosa capacidade se apagou com o fim da Companhia de Jesus e das ordens religiosas vocacionadas para a predicação, as quais conheciam o valor da comunicação e da aventura do discurso sem papéis. Desses séculos de vivência com a língua como arma feita de paixão, persuasão e conquista ficou pouco, muito pouco. Desde então, umas figuras pálidas, imóveis, recolhidas e escravas de papéis passaram a desencantar a língua, secando-a e enfatuando-a. Há, pois, que restaurar nos oradores portugueses essa espontaneidade esquecida, ensinar-lhes a arte da encantação, pois o verbo faz maravilhas. Perante o discurso que [se] mata, há que reencontrar o discurso que humaniza, arranca aplausos, desperta sentimentos, materializa a adesão ou a aversão. No fundo, trata-se de ensinar às nossas crianças a arte de se transcenderem e encontrarem a chama que está represada nos corações. A língua portuguesa precisa, urgentemente, de se libertar dos seus carcereiros.
MCB
Sem comentários:
Enviar um comentário