O
Essencial que pode unir-nos e a Inteligência esclarecida proclama, e as
lições multiseculares da História confirmam; o Essencial que pode
unir-nos e a Filosofia formula, e a Experiência garante, é constituído
por três noções substanciais que eu, desde a maioridade do meu Espírito,
caracterizada pela mais intensa independência e a mais manifesta
autonomia, infatigavelmente afirmo: Deus, Pátria e Rei.
Deus – na
pureza do Dogma católico – o único verdadeiro; Pátria, na plena
manifestação da sua soberania indecomponível; Rei – como sempre foram os
Reis legítimos: responsáveis perante Deus, sem os outros embaraços nas
suas determinações que não sejam os da sua consciência e os da
compreensão dos seus deveres.
Deus – não o Deus dos vários cultos,
superstições, idolatrias, ou religiões, mas o Deus da Igreja Católica
Apostólica Romana que tem sido, até agora, a única Religião verdadeira
no mundo, e que para mim, será, até o último alento, a única religião
verdadeira na vida.
Deus – o Deus do Catolicismo definido e rigoroso,
e não o Deus do Cristianismo furta-cores, saco onde cabe tudo – desde o
Rotarismo maçónico ao Liberalismo maritainesco, desde a heresia
luterana ao teosofismo americano.
Deus – o Deus do Catolicismo que é o
único em que creio, o único que adoro, e não o Deus dos conclaves
internacionais, pau para toda a obra, leitmotiv de todos os discursos de
todas as chafaricas leigas e racionalistas, moeda de troca no balcão de
Estaline, ou no guichet de Truman.
Pátria – a Pátria dos nossos
antepassados que se fez contra o castelhano ou contra o mouro, que teve
os judeus concentrados nos seus ghettos, e abriu as portas do mundo aos
outros povos.
Pátria – a Pátria dos portugueses, cuidadosa das suas
fronteiras, ciosa da sua liberdade, e inflexivelmente fiel à sua
soberania, e não a Pátria bastarda, diminuída na sua vontade, algemada
na sua expansão, e cerceada no seu Direito.
Pátria – a Pátria de
Ourique e de Aljubarrota, de Montes Claros e do Bussaco; a Pátria que
dominou os mares e a Índia, que fez o Brasil, e deu a volta ao mundo, e,
em pleno século XIX, perante a Europa atónita, trouxe à corte de
Portugal, como escravo, o maior e mais temível régulo da África oriental
– amigo de S. Majestade a Rainha Victória da Grã-Bretanha, e Imperatriz
das Índias...
Pátria – a Pátria da luminosa dinastia dos soldados do
Ultramar, que começa em Ceuta, na madrugada do século XV e vive ainda,
palpitante de glória e de audácia, no século XIX representada pelos
legítimos émulos dos Albuquerques, dos Joões de Castro, dos Duartes
Pachecos, dos Salvadores Correia de Sá.
Pátria – a Pátria que cantou e
lavrou, navegou e batalhou, de cara erguida, e só se humilhou, contrita
e frágil, a pedir perdão a Deus.
É essa Pátria imortal e altiva,
capaz de dizer sim e capaz de dizer não, a Pátria das minhas convicções e
das minhas aspirações, e não a Pátria que me querem dar, enquadrada em
Federações ocidentais, sacrificando a sua independência em benefício dos
outros, diminuindo a sua Vontade de Poder, para servir os outros,
algemada, encadeada, mutilada, decepada para vantagem e gozo dos outros.
Rei
– aquele Rei que a Realeza legítima e pura – legítima e pura na sua
origem, legítima e pura na sua orgânica, legítima e pura na sua
finalidade –, compreende, forma e garante.
Não esse Rei serventuário
dos caprichos das turbas, enfeudado aos interesses volúveis das facções,
enredado nos concluios dos grupos, à mercê, como catavento dócil, das
combinações e das ambições dos demagogos e aventureiros, – mas aquele
Rei que possa dizer, como no verso de Horácio: «Non ego uentosa plebis
suffragia uenor».
Não a esse Rei, boneco de Entrudo, palhaço de
feira, movido a cordel, como os títeres das barracas dos Robertos, que o
Liberalismo inventou, espalhou e consagrou – mas aquele Rei que reina e
governa, que não cede o leme da Nau, porque só ele é responsável,
perante Deus e perante a História, dos destinos do seu Povo.
Não
podia dispensar-me de lembrar e fixar esta base doutrinária, porque só
ela explica e justifica aquilo que vou dizer. É absolutamente necessário
partir-se dessa base prévia e tê-la presente, para se compreender a
posição que vou marcar.
Sou intransigentemente, fanaticamente
católico; sou intransigentemente, fanaticamente patriota; sou
intransigentemente, fanaticamente monárquico.
A intransigência não
exclui a compreensão dos princípios, dos pontos de vista diferentes:
antes a supõe: é precisamente porque compreendo o erro, que sou
intransigentemente pela verdade.
O fanatismo não exclui a consciência
raciocinante e a objectividade analítica: antes as supõe: é
precisamente porque, em profundidade e em largueza, vivo, discuto,
ausculto e critico; é precisamente porque estudo a frio, sem paixão que
perturbe, sem amor que deforme, sem interesse que perverta, ou sem
receio que acobarde, que sou fanático da Ideia que sustento, do plano em
que me coloco.
Porque intransigente, não abdico, não contemporizo, não cedo; porque fanático, não me conformo nem me convenço.
Católico
– sou católico integral, na aceitação do Dogma, na sujeição ao Credo
que é indiferente ao que foi ou poderá ser; patriota – sou patriota
integral, exclusivista, só duma peça; monárquico – sou monárquico
integral, não admitindo transacções, subterfúgios, plebiscitos.
Não
sou, pois, católico progressivo, papagaio de Maritain, a proclamar que a
Igreja viveu vinte séculos no erro e no desvairo, sem se aperceber de
que outro era o caminho a seguir, na sua missão e no seu dever, e de que
o Social deve ser anteposto a tudo, substituindo a Terra em que vivemos
ao Céu a que aspiramos e para que nascemos.
Não sou, pois, patriota
manchado de Internacionalismo, pacifista por definição, e perpetuamente
agachado diante do Estrangeiro – seja a Inglaterra que nos despreza, a
Espanha que nos amesquinha, e o Brasil que nos não pode ver.
Não sou, pois, monárquico que reconhece a República, que a confunde com a Pátria, que a julga capaz de bem servir a Pátria.
O
Catolicismo progressivo é a Formiga Branca introduzida na Igreja. O
Patriotismo internacionalizado é a anemia da Nação; o Monarquismo
conchavado com a República é a Realeza traída.
O Catolicismo, o
Patriotismo, o Monarquismo são conceitos fechados, noções rígidas, que
não toleram elasticidade, mais ou menos. Toda a fissura que se abra
nesses conceitos ou nessas noções é ataque fundamental à sua natureza;
todo o énthema que se introduza nessas noções ou nesses conceitos é
instrumento de corrupção do seu sistema; toda a emenda, correcção ou
acrescento que se proponha a tais noções ou conceitos é o seu
descrédito.
Toda a relatividade é diminuição do Ser. Ora os conceitos que acabo de enunciar são absolutos como o sim ou o não.
Salazar,
ficando a meio caminho, disse um dia: «não se discute Deus, não se
discute a Pátria». Eu acrescento: «não se discute a Realeza – porque
Portugal é obra de Deus, do Rei e do Povo»...
Alfredo Pimenta in «Contra a Democracia».
Alfredo Pimenta in «Contra a Democracia».
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